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| - No dia 10 de março, Carlos Moedas, candidato do PSD à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, foi o protagonista da “Grande Entrevista” da RTP, tendo a oportunidade de apresentar o seu projeto político para a cidade. Mas não se falou apenas do presente e futuro, também surgiram questões relacionadas com o seu passado nas funções de secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro (entre 2011 e 2014, até ser nomeado para o cargo de Comissário Europeu para a Investigação, Inovação e Ciência) no Governo liderado por Pedro Passos Coelho.
Questionado sobre os efeitos da revisão do regime jurídico do arrendamento urbano em 2012, comummente apelidada de “Lei Cristas” (em referência a Assunção Cristas, responsável direta pela iniciativa, então líder do CDS-PP e desempenhando as funções de ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território), Moedas disse estar “completamente confortável”.
“Essa lei das rendas da altura, que teria os seus defeitos e as suas qualidades, primeiro: permitia sempre àqueles que fossem mais velhos ficarem até ao fim da vida nas casas. Permitia também ter um subsídio de renda para aqueles que não podiam pagar“, sublinhou Moedas.
Quase instantaneamente surgiram nas redes sociais desmentidos relativamente a esta alegação do agora candidato à Câmara de Lisboa. Confirma-se ou não que a nova lei das rendas (introduzida em 2012) “permitia aos mais velhos ficarem até ao fim da vida nas casas”?
Analisando a Lei n.º31/2012 que “procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, o Código de Processo Civil e a Lei n.º6/2006″, verifica-se que no caso de o arrendatário invocar que tem idade igual ou superior a 65 anos, o contrato em vigor só transitaria para o novo regime de arrendamento – uma espécie de mercado liberalizado – “mediante acordo entre as partes“.
Isto significa que esse contrato só poderia sofrer alterações, nomeadamente aumentos de renda, depois de o senhorio fazer a proposta e o inquilino autorizar. Caso este autorizasse, o inquilino ainda teria um período transitório de cinco anos, assim como “direito a uma resposta social, nomeadamente através de subsídio de renda“. Caso contrário, mantinham-se em vigor “os regimes da renda condicionada“.
Em relação aos despejos, se o novo regime fosse aceite pelo arrendatário, a lei estabelece que “o disposto na alínea c) do artigo 1101.º do Código Civil não se aplica se o arrendatário tiver idade igual ou superior a 65 anos“, sendo que esse artigo do Código Civil prevê que “o senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada mediante a comunicação (…) com antecedência não inferior a dois anos“.
Ou seja, no caso de o arrendatário ter idade igual ou superior a 65 anos, o senhorio só poderia denunciar o contrato por “necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau”, ou “para demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos que obriguem à desocupação do locado” e não por outro motivo, mesmo que comunicasse com antecedência.
Apesar da intenção expressa de salvaguarda dos idosos, é importante sublinhar que, ainda assim, foram muitos os que foram vítimas de despejo por parte dos proprietários – sobretudo fundos imobiliários que adquiriram prédios inteiros para requalificar e explorar – que utilizaram frequentemente o argumento da demolição ou realização de obras profundas para “desimpedir” os edifícios.
Para fazer face a alegados abusos por parte dos proprietários, já em 2018, foi aprovado na Assembleia da República um projeto de lei determinando que a realização de obras profundas nos imóveis deixa de dar direito à denúncia do contrato de arrendamento, a não ser que a intervenção altere completamente a tipologia e finalidade do imóvel. Nestas situações, os contratos ficam suspensos durante a realização das obras, cujo valor deve corresponder a 25% do valor de mercado do imóvel. A suspensão dos contratos pode durar até três anos, período em que o senhorio terá de assegurar alternativa de alojamento.
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Atualização: Na sequência da publicação deste artigo fomos alertados por um leitor para um elemento relevante no Artigo 1101º (Denúncia pelo senhorio) do Decreto-Lei n.º 47344 do Código Civil. Na alínea b) determina-se que “o senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada (…) para demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos que obriguem à desocupação do locado”. Esta última condição – “que obriguem à desocupação do locado” – foi introduzida em 2012, não estava prevista na versão anterior, criada em 2006. Pelo que se trata de mais um elemento de proteção dos inquilinos em geral – e dos mais idosos em particular – assegurado na revisão de 2012.
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Avaliação do Polígrafo:
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