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| - O assunto foi trazido à praça pública no Twitter, a propósito do projeto de lei apresentado por Joacine Katar Moreira, que cria o regime de proteção e ampliação do arvoredo urbano, também como forma de ajudar a promover a retenção de água nos solos. “Matos Fernandes, alegado ministro do Ambiente, autorizou o abate de 264 sobreiros em Vila Nova de Cacela para construção de campo de golfe. Hoje, com cara de pau, aparece a pedir que o preço da água reflita a escassez do recurso”, pode ler-se no tweet em causa, posteriormente retweetado pela deputada não inscrita.
Será que é verdade que o ministro do Ambiente e da Ação Climática defende um aumento do preço da água para refletir a escassez do recurso, mas autorizou o abate de 264 sobreiros em Vila Nova de Cacela, no distrito de Vila Real de Santo António, para construir um campo de golfe num empreendimento turístico?
A pergunta não é passível de uma resposta imediata.
É verdade que a 22 de março deste ano, Matos Fernandes afirmou que “se o produto água está a tornar-se escasso, o preço deve refletir essa escassez, tanto mais que esse preço é o sinal mais forte que temos a dar aos utilizadores da água no sentido de a usarem de forma mais parcimoniosa”.
Também é verdade que, no âmbito do projeto para a construção do campo de golfe sul no Monte Rei — Golf & Country Club, conhecido em 2019, a entidade promotora solicitou o abate de centenas de árvores, entre as quais se contavam sobreiros, uma espécie que desempenha um papel fundamental na regulação hidrológica e conservação dos solos, fornecendo proteção contra a erosão eólica e aumentando a taxa a que a água da chuva se infiltra e reabastece os lençóis freáticos. Como medida compensatória pelo abate das árvores, o promotor comprometeu-se a plantar novos exemplares das espécies mais afectadas – os sobreiros e as azinheiras. Depois de ter estado em consulta pública, o projeto, que ainda não foi construído, foi aprovado.
Contactado pelo Polígrafo, o gabinete de Matos Fernandes rejeita que o ministro tenha autorizado pessoalmente o abate dos 264 sobreiros de que fala a publicação partilhada por Joacine Katar Moreira: “O ministro do Ambiente e da Ação Climática não tem intervenção nestas matérias. A autorização para o abate de sobreiros e de outras espécies com algum tipo de proteção é matéria da competência do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
O Polígrafo questionou o ICNF, que esclarece que em relação ao empreendimento de Vila Nova de Cacela “foi solicitada autorização para corte/abate de 136 sobreiros adultos e 120 azinheiras jovens”. No entanto, fonte oficial do Instituto sublinha que, após uma vistoria ao local, “autorizou-se o corte de 101 sobreiros e 103 azinheiras, por se verificar serem árvores decrépitas e secas”. Ou seja, apesar de se confirmar que foi viabilizado o abate de sobreiros, o número invocado na publicação em análise está incorreto – em vez de 264, foram 101 os sobreiros cortados.
O que nem o gabinete do ministro do Ambiente e da Ação Climática nem o ICNF disseram ao Polígrafo foi o que se segue:
1 – Que o ICNF é tutelado pelo Ministério do Ambiente, que tem responsabilidade política pelos atos praticados pelas entidades que lhe são hierarquicamente dependentes;
2 – Que para que uma intervenção desta amplitude tenha lugar, deve ser aprovada uma declaração de utilidade pública do projeto. Ora, esta aprovação é da competência do Governo, sob proposta da entidade promotora.
Em conclusão, é verdade que Matos Fernandes defendeu o aumento do processo da água de forma a refletir a escassez do recurso e que esta declaração pode, em tese, colidir com a decisão de abate de uma espécie como a do sobreiro. Porém, não é possível concluir com toda a certeza que o ministro tenha estado pessoalmente envolvido na decisão em causa, uma vez que, de facto, o ICNF tem competência para gerir esse tipo de matérias.
Pode também concluir-se que, à luz dos dados oficiais, os números apresentados na publicação sob verificação não são rigorosos.
Nota editorial: este artigo foi atualizado às 13h50 com a introdução de novas informações, nomeadamente as relativas à tutela política do ICNF. A avaliação final sofreu uma alteração, tendo passado de “Falso” para “Impreciso”.
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Avaliação do Polígrafo:
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