schema:text
| - No decurso de uma iniciativa do Bloco de Esquerda em Setúbal, realizada ontem, dia 8 de outubro, questionada por jornalistas sobre o Orçamento do Estado para 2023, Catarina Martins sublinhou que o Governo está resignado com a perda de poder de compra dos portugueses devido à inflação.
“O Governo já se resignou ao facto de quem trabalha, de quem recebe salário e pensão, já ter perdido para a inflação o equivalente a um mês de salário ou um mês de pensão. E o salário do próximo ano vai manter esta perda. O Governo fala-nos de aumentos que, do ponto de vista nominal, até parecem maiores do que no passado, mas, com a inflação tão alta, tudo o que o Governo está a anunciar é que vai haver uma perda real do poder de compra, tanto dos salários como das pensões, num país em que já é tão difícil a quem trabalha chegar até ao fim do mês”, declarou a coordenadora dos bloquistas.
Martins referiu-se depois mais especificamente ao salário mínimo nacional que o Governo propõe aumentar em 7,8% no próximo ano, de 705 para 760 euros.
“O salário mínimo nacional, em termos reais, vai perder. As pessoas vão ter menos poder de compra do que tinham, isto não acontecia desde 2016“, afirmou.
Confirma-se que o salário mínimo nacional não perde poder de compra desde 2016?
De facto, o salário mínimo nacional permaneceu congelado no valor de 485 euros durante o período de intervenção da troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), entre 2011 e 2014.
Ora, nos anos de 2011, 2012 e 2013 registaram-se taxas de inflação de 3,7%, 2,8% e 0,3%, respetivamente, pelo que o salário mínimo nacional perdeu sempre poder de compra – em termos reais – nesses três anos.
No ano de 2014, porém, a taxa de inflação caiu para níveis negativos: -0,3%. Pelo que, mesmo congelado, o salário mínimo nacional não perdeu poder de compra em termos reais.
Aliás, o salário mínimo nacional aumentou 4,1% para 505 euros em 2015, muito acima da taxa de inflação registada nesse ano que não foi além de 0,5%.
Chegamos então a 2016, ano indicado por Martins como o último em que o salário mínimo nacional terá perdido poder de compra. Na realidade, a taxa de inflação nesse ano ascendeu a 0,6%, ao passo que o salário mínimo nacional voltou a aumentar em cerca de 5% para 530 euros.
Ou seja, o salário mínimo nacional não perdeu poder de compra em 2016. A última vez que tal se verificou foi em 2013.
Por outro lado, se o Governo concretizar o aumento de 7,8% do salário mínimo nacional em 2023 e se se confirmar a previsão de 4% para a taxa de inflação em 2023, também não se confirma que o salário mínimo nacional vá perder poder de compra no próximo ano. Mas estamos perante conjeturas, previsões, estimativas, pelo que não é possível chegar a uma resposta conclusiva neste ponto.
Mas estaria Martins a basear-se nos números do presente ano de 2022?
De facto, o salário mínimo nacional aumentou este ano em cerca de 6% para 705 euros, ao passo que a taxa de inflação deverá atingir 7,4% – de acordo com a previsão do Governo – ou 7,8% – segundo a mais recente estimativa do Banco de Portugal. O problema é que Martins aponta para o futuro, “vai perder”, no próximo ano.
Em suma, a declaração em causa da líder do Bloco de Esquerda não é de todo rigorosa.
Quer em relação ao último ano em que o salário mínimo nacional perdeu poder de compra em termos reais – foi em 2013 e não em 2016 -, quer em relação ao ano exato em que voltará a perder poder de compra – em 2022 parece ser quase certo, em 2023 depende ainda de muitas variáveis e não é possível dar uma resposta conclusiva, embora as previsões do Governo indiquem que não vai perder.
______________________________
Avaliação do Polígrafo:
|