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| - O alerta foi dado por uma utilizadora do Twitter, no dia 30 de maio, sendo replicado por vários internautas nas horas seguintes: “Então não é que a Rita Matias decidiu plagiar um discurso da Giorgia Meloni do Fratelli d’Italia? Ainda por cima um discurso com ideias tão retrógradas. Querem eles ser um partido com ideias próprias, quando nem um simples discurso conseguem escrever sem plagiar?”
O tweet contém ainda um vídeo com partes das intervenções de ambas as representantes políticas, intercalando as frases de Rita Matias com as originais de Meloni, proferidas há mais de dois anos. O Polígrafo analisou os dois discursos e contactou a vogal do Chega.
De facto, a 30 de março de 2019, em Verona, Itália, no Congresso Mundial da Família, Giorgia Meloni, presidente do partido pós-fascista Fratelli d’Italia e ainda do grupo político Conservador e Reformista no Parlamento Europeu, proferia então um discurso de cerca de 13 minutos, mais tarde apelidado de anti-feminista e ultra-conservador. Dois anos depois, Rita Matias recuperou várias frases dessa intervenção, adaptando-as com ligeiras alterações, nos últimos minutos dos nove a que teve direito no III Congresso do Chega, em Coimbra, no dia 29 de maio.
Giorgia Meloni: “Eu penso que retrógrado é quem tenta voltar a trazer a censura a Itália, fazendo com que não se possa celebrar um encontro como este (…) Os imprestáveis não somos nós. Os imprestáveis são aqueles que sustentam práticas como a barriga de aluguer ou o aborto ao nono mês e a tentativa de bloquear com hormonas o desenvolvimento de crianças com 11 anos de idade”.
Rita Matias: “O que é absolutamente retrógrado é querer trazer de novo uma cultura de censura para Portugal. E dizem que os loucos somos nós? Loucura é defender a banalização do assassinato de crianças no ventre materno. Loucura é bloquear com hormonas o desenvolvimento das crianças. Loucura é roubarem a inocência das crianças, tendo em vista interesses económicos para impor uma ideologia perversa”.
Giorgia Meloni: “Disseram de tudo sobre este congresso. Que queremos limitar a liberdade das mulheres. Que as queremos em casa a aspirar. Vocês vêm-me em casa a aspirar? Imaginem que eu, a única mulher secretária de um partido político em Itália, eu que me apresentei grávida na candidatura a autarca de Roma, pensasse que as mulheres devem ser relegadas não se sabe bem a quê. É exatamente o contrário. Nós queremos garantir direitos que hoje não existem. O direito de uma mulher ser mãe sem ter com isso que renunciar a um posto de trabalho. O direito de uma mulher ser mãe, escolher não trabalhar e não ter, por isso, que morrer de fome. O direito de uma mulher que pensa que tem de abortar porque não tem alternativa a ter essa opção, porque não é verdade que hoje é garantida a autodeterminação da mulher”.
Rita Matias: “Mas sempre que falo destas coisas, dizem que quero limitar a liberdade das mulheres e que o que eu penso é que o lugar da mulher é na cozinha. Mas o que seria de mim, estaria eu aqui se achasse que as mulheres devem estar relegadas a qualquer papel? (…) Chega e chega de dissimulados, porque estes dissimulados demitem-se, também, da defesa dos direitos que ainda não existem em Portugal em pleno século XXI. Por exemplo, o direito de uma mulher ser mãe sem ter de renunciar à possibilidade de progressão na carreira. Ou então, de escolher não trabalhar, mas, por isso, não ficar condenada à precariedade“.
Tornam-se assim inegáveis as semelhanças entre os dois discursos, que de resto se verificam também na postura e no tom com que são proferidas as frases supracitadas. O ênfase dado por Meloni a determinadas palavras é recuperado por Rita Matias, bem como alguns gestos ou até mesmo os compassos de espera.
Instada a pronunciar-se sobre as acusações, Rita Matias considera “ridículo e lamentável que se esteja a fazer este juízo de valor”, uma vez que “é bastante comum que partidos com matrizes idênticas defendam os mesmos valores, abordem as mesmas questões, naturalmente aplicadas às respectivas realidades”.
“Temas como a defesa da família, da natalidade, da segurança e da defesa da valorização salarial da mulher e respetiva autonomia financeira são transversais a vários protagonistas da direita europeia. Quem ouvir atentamente o meu discurso e o da Giorgia Meloni facilmente se apercebe que a minha intervenção é muito mais abrangente, em termos de temas, do que a da Presidente do Fratelli”, esclarece ainda Rita Matias.
Ao Polígrafo, a vogal da direção do Chega diz mesmo que “não é segredo nenhum que existem sempre, especialmente neste meio, referências políticas” sendo que, no que toca à defesa do papel da mulher, da dignidade da vida humana e da família, Rita Matias segue figuras como “Rocío Monasterio, Giorgia Meloni ou Abby Johnson”, a primeira presidente do VOX em Madrid e a última uma ativista anti-aborto americana.
Esta situação, embora peculiar, tem já precedentes na política de extrema-direita europeia. Em maio de 2017, Marine Le Pen, à data candidata presidencial pelo partido Frente Nacional francês, plagiou num comício um discurso do ex-candidato conservador François Fillon.
Neste caso, tratava-se mesmo de uma cópia completa, sem quaisquer adaptações, promovido até pelo facto de falarem na mesma língua. Segundo porta-vozes da Frente Nacional, ter-se-á tratado de um plágio propositado, mostrando que Le Pen era uma candidata “unitária e não sectária”.
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Avaliação do Polígrafo:
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