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| - Quando se noticia a ocorrência de um crime, a cor da pele ou a identificação étnica dos suspeitos não costumam ser elementos relevantes no âmbito do trabalho dos jornalistas. Desde logo porque são elementos subjetivos, dificilmente perceptíveis apenas pela aparência das pessoas, exponenciando a probabilidade de erro ou equívoco. Mais importante, para não violar o disposto no Artigo 9.º do Código Deontólogico dos Jornalistas que passamos a transcrever:
“O jornalista deve rejeitar o tratamento discriminatório das pessoas em função da ascendência, cor, etnia, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social, idade, sexo, género ou orientação sexual.”
Daí a estranheza perante uma suposta notícia do jornal “Observador” com o seguinte título em destaque: “Grupo de ciganos ‘invade’ Urgências do Hospital de Famalicão e provoca três feridos.” A identificação étnica ou cultural dos membros do grupo não é um elemento relevante e o mesmo se aplicaria a um “grupo de pessoas com a pele mais clara” ou a um “grupo de crentes da religião católica”. Não altera os factos ou a natureza do crime, nem um qualquer crime é agravado por causa de tais características.
Na realidade trata-se de uma imagem adulterada, com a referência à etnia cigana a ser adicionada ao título original de uma notícia (verdadeira) da Agência Lusa, publicada pelo jornal “Observador” no dia 22 de fevereiro de 2022.
“Um grupo de cerca de 10 pessoas ‘irrompeu’, na madrugada desta terça-feira, nas Urgências do Hospital de Famalicão e agrediu um elemento da segurança e profissionais de saúde, provocando três feridos, disseram fontes hospitalar e policial”, informou a Agência Lusa.
“Em comunicado, o Centro Hospitalar do Médio Ave refere que o episódio foi registado pelas 3h30, quando o grupo entrou ‘de forma agressiva’ no Serviço de Urgência, acompanhando uma mulher”, descreve-se no mesmo artigo. “‘Quando solicitados a acalmarem-se pelo elemento de segurança, agrediram-no com violência, forçaram a entrada no serviço e, quando de novo lhes foi pedida calma, agrediram os profissionais de saúde que se aproximaram, tendo provocado ferimentos com alguma gravidade em dois profissionais’, acrescenta”.
Este caso de violência no Hospital de Famalicão foi noticiado pela generalidade dos órgãos de comunicação social em Portugal e não encontramos qualquer referência à identificação étnica dos agressores.
Nas caixas de comentários das publicações com a imagem adulterada no Facebook (inclusive na página oficial do partido Chega) abundam os impropérios racistas, xenófobos e odiosos contra as pessoas de etnia cigana como um todo.
Além de conter a propagação da falsidade, o presente esclarecimento visa também salvaguardar a lisura deontológica dos nossos colegas de profissão do jornal “Observador” que, na verdade, não publicou aquele título.
De resto, as situações de violência contra profissionais de saúde têm sido recorrentes. Só entre março e dezembro de 2021 foram notificados mais de 750 casos de agressões a médicos e enfermeiros à Direção-Geral da Saúde. As notícias informam sobre as agressões, não sobre a identificação étnica dos agressores (evitando assim um tratamento discriminatório das pessoas, respeitando o supracitado preceito deontológico). Terminamos com alguns exemplos de títulos de notícias mais ou menos recentes:
“Enfermeiros agredidos no Hospital de São João devido a demora no atendimento” (14/02/2018)
“Cirurgião esfaqueado enquanto fazia intervenção no Hospital de Peniche” (25/02/2019)
“Médica agredida por utente na urgência do Hospital de Setúbal” (27/12/2019)
“Médico recusou passar baixa e foi agredido a soco e a pontapé” (02/01/2020)
“Três casos de violência contra médicos em menos de uma semana” (03/01/2020)
“Enfermeira agredida nas Urgências do Hospital de Santa Maria” (08/01/2020)
“Médica do Hospital de Loures agredida por utente” (19/08/2021)
“Hospital de Gaia processa utente que agrediu médica na última madrugada” (20/12/2021)
“Jovem detida por agredir enfermeiro no Hospital de Aveiro” (21/12/2021)
“Equipa do INEM agredida em Vila Nova de Gaia” (02/01/2022)
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.
Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:
Falso: as principais alegações dos conteúdos são factualmente imprecisas; geralmente, esta opção corresponde às classificações “Falso” ou “Maioritariamente Falso” nos sites de verificadores de factos.
Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:
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