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| - Primeiro, as contas do Ministério das Finanças: no início de 2023, Fernando Medina e António Costa anunciavam um défice próximo de -1,5% do PIB em 2022, ou seja, a rondar os 3.590 milhões de euros. Este valor até poderia ter sido uma realidade, mas alterações do Instituto Nacional de Estatística (INE) no cálculo das operações nas contas públicas baralharam o Governo: agora, com um défice calculado de 944 milhões de euros (-0,4% do PIB) e uma folga orçamental de 3.500 milhões de euros, o que tem de fazer o Governo para devolver aos contribuintes a receita adicional cobrada em 2022?
Contas certas, folga assinalável
Apesar de ter garantido, ainda esta sexta-feira, que o Governo cumpriu o “compromisso de distribuir toda a receita que se gerasse por via dos melhores resultados que pudessem acontecer”, o que é certo é que as declarações de Fernando Medina só se confirmam se tivermos em conta as medidas tomadas já em 2023, depois de ser conhecida a folga orçamental.
Em 2022, no pico da crise energética e inflacionista, o Governo alargou os cordões à bolsa e somou apoios às famílias e empresas num total de mais de 5,7 mil milhões de euros. Ainda assim, os dados do INE divulgados esta sexta-feira comprovam uma folga de 3,5 mil milhões de euros, que o Governo não distribuiu por completo mas que promete, já em 2023, zerar totalmente. As contas são as seguintes:
A redução do IVA dos bens alimentares essenciais (410 milhões de euros), o apoio à produção agrícola (140 milhões de euros), o reforço do subsídio de refeição (250 milhões de euros), o aumento extraordinário dos trabalhadores das Administrações Públicas (195 milhões de euros), o apoio às famílias mais vulneráveis (580 milhões de euros), o programa “Mais Habitação” e outras medidas (900 milhões de euros) totalizam 2,5 mil milhões de euros em apoios adicionais. Nos 900 milhões de euros está “o apoio à renda, a despesa fiscal ao IRS e a isenção de mais-valias, quando mobilizadas para liquidar empréstimos associados a habitação própria e permanente”. Neste montante, o Governo também já inclui “a bonificação de juros e das duas linhas de crédito: a primeira destinada aos municípios para obras coercivas e destinada aos agentes privados com quem venham a ser celebrados contratos habitacionais”, segundo explicou o ministro das Finanças na apresentação do programa.
Voltando a frisar que o défice de 2022 ficou cerca de 3.500 milhões de euros abaixo do que era esperado, há que lembrar que há medidas de 2022 que só entram em 2023. Assim, qual é, afinal, o bolo que o Governo pode distribuir este ano? O impacto da medida de apoio às famílias na fatura do gás, 1.000 milhões de euros, encolhe precisamente nesse montante o saldo com que Portugal conta em 2023 para atuar nos apoios sociais. E estes, embora não estejam ainda totalmente certos (como na habitação, com o Presidente da República a ameaçar o veto de algumas medidas), zeram por completo o montante disponível ao Governo para atuar. São exatamente 2,5 mil milhões de saldo e 2,5 mil milhões de medidas: resta saber apenas quais serão aplicadas e quais ficarão pelo caminho.
Ao Polígrafo, o deputado liberal Carlos Guimarães Pinto explica que os próprios cálculos do Governo mostram que o mesmo não fez a devolução completa do que devia durante o ano de 2022 e que a está a fazer apenas agora, em 2023, mediante uma arrecadação extra de cerca de 8,8 mil milhões de euros com impostos. Com a variação da despesa e a subtração das medidas de 2022 para mitigação da inflação, sobram os tais 2,5 mil milhões a serem aplicados em 2023 no conjunto de medidas apresentado na semana passada.
As considerações do deputado não influenciam os cálculos do Polígrafo, mas lembram que “o Governo continua, este ano, a receber mais receitas via inflação”. A “justificação possível” para o Governo é dizer que, “no ano passado, a inflação no Orçamento do Estado foi subestimada e, este ano, pode já não ser. Ou seja, as receitas adicionais via inflação podem ser já consideradas no Orçamento do Estado para 2023, o que não aconteceu no documento de 2022”, acrescenta.
Em suma, os números do Governo batem certo, mas a verdade é que ainda há um valor muito substancial por aplicar (como é o caso do pacote da habitação, cujo futuro ainda é incerto dadas as reticências já manifestadas por Marcelo Rebelo de Sousa em relação a alguns pontos da medida), pelo que o grau de certeza sobre a sua implementação efetiva no terreno não é absoluto. Por esse motivo, optámos pela avaliação de “Verdadeiro, mas…”
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Avaliação do Polígrafo:
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