schema:text
| - “Presidente Marcelo, deixe o Cristiano Ronaldo em paz e preocupe-se com os corruptos que roubam os portugueses”, destaca a página “Direita Política”, frequentemente ligada à distribuição de desinformação, em publicação de 30 de janeiro de 2019, ilustrada por um “meme” com as imagens de Cristiano Ronaldo, Marcelo de Sousa, Armando Vara, José Sócrates, Jardim Gonçalves e Zeinal Bava. “Marcelo Rebelo de Sousa está preocupado com as condecorações do Ronaldo, mas não se preocupa com as condecorações dos corruptos”, denuncia o “meme” que está a ser difundido nas redes sociais.
No texto da publicação sustenta-se que “este Marcelo é um cromo – não colecionável. Este Marcelo é um venenoso invejoso e odiento. Marcelo pediu ao Conselho das Ordens para avaliar se Ronaldo pode manter condecorações nacionais? Ó senhor Presidente, agora tive de rir. O Ronaldo? Tem mesmo a certeza? Vou lembrá-lo de que: Zeinal Bava (Grã-Cruz da Ordem do Mérito Empresarial); Valentim Loureiro (Comendador da Ordem do Mérito); Hélder Bataglia (Comendador da Ordem do Infante D. Henrique); Armando Vara (Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique); Macário Correia (Grande-Oficial da Ordem do Mérito); Jardim Gonçalves, (Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique); Henrique Granadeiro (Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo); José Sócrates (Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique); Miguel Horta e Costa (Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique); Manuel Espírito Santo (Grã-Cruz da Ordem do Mérito Empresarial); João Teixeira (Comenda da Ordem do Mérito); Lino Maia (Grau de Grande-Oficial da Ordem do Mérito); Carlos Cruz (Medalha de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique); Jorge Ritto (Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique).
A mensagem implícita da publicação é que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pretende retirar as condecorações de Cristiano Ronaldo, mantendo contudo as condecorações de outros cidadãos nacionais condenados ou suspeitos de crimes. É essa a interpretação predominante nos comentários e entre quem partilha a publicação em causa. Vários leitores do Polígrafo questionaram, via WhatsApp (968213823), se é verdade ou mentira.
Começando pela suposta intenção do Presidente da República de retirar as condecorações de Ronaldo. O facto é que, na semana passada, Rebelo de Sousa limitou-se a pedir um parecer ao Conselho das Ordens Nacionais (liderado pela “chanceler” Manuela Ferreira Leite, ex-líder do PSD e ex-ministra das Finanças) para avaliar se Ronaldo pode ou não manter as condecorações nacionais que detém, na sequência de ter sido condenado em Espanha por crimes de fraude fiscal. De acordo com o jornal “Expresso” (23 de janeiro de 2019), “Rebelo de Sousa quer saber se o facto de o futebolista ter pago uma coima para substituir a pena suspensa de 23 meses a que foi condenado em Espanha lhe permite manter a condecorações que recebeu do Estado português”.
Ronaldo foi condecorado por Aníbal Cavaco Silva em 2014, com a Grã Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, e por Rebelo de Sousa em 2016, com a Grã Cruz da Ordem de Mérito. De acordo com a Lei das Ordens Honoríficas Portuguesas, qualquer cidadão português que tenha sido condecorado, “perde automaticamente o título que lhe foi concedido se for condenado por sentença judicial transitada em julgado pela prática de crime doloso punida com pena de prisão superior a três anos”. Ou seja, Rebelo de Sousa está apenas a procurar cumprir a lei, pedindo um esclarecimento ao Conselho das Ordens Nacionais sobre se a perda automática das condecorações se aplica, ou não, ao caso de Ronaldo, na medida em que pagou uma coima para susbtituir a pena suspensa a que foi condenado.
Como o Polígrafo já salientou em publicação recente, a verdade é que a perda das duas distinções de Ronaldo só seria automática se tivesse sido condenado a uma pena de prisão superior a três anos – o que não aconteceu. Por outro lado, há que ter em conta que a condenação põe em causa os deveres dos condecorados, os quais devem seguir uma conduta ditada pela “virtude”, pela “honra” e pela defesa de Portugal em “todas as circunstâncias”, de acordo com a Lei das Ordens Honoríficas Portuguesas. A decisão sobre a perda ou manutenção das condecorações de Ronaldo implicará uma análise jurídica da situação em causa. É nesse âmbito que se insere a iniciativa de Rebelo de Sousa.
Quanto à lista de condecorados apresentada na página “Direita Política”, importa salientar que Carlos Cruz e Jorge Ritto perderam entretanto as suas condecorações. Condenados no processo Casa Pia por abuso sexual de crianças, ficaram sem as condecorações da Ordem do Infante D. Henrique que lhes tinham sido atribuídas pelos ex-Presidentes Jorge Sampaio e Mário Soares, respetivamente. Essa informação foi confimada em 2015 por Ferreira Leite, “chanceler” do Conselho das Ordens Nacionais. Esses dois processos de irradiação foram inéditos. Até hoje não se verificou mais nenhum caso de perda de condecorações.
Mas não por muito tempo, pois Armando Vara também está prestes a perder a Ordem do Infante que recebeu em 2005 do então Presidente Jorge Sampaio, devido à sua participação na organização do Campeonato da Europa de 2004 em Portugal, como governante. Vara foi condenado a cinco anos de prisão efetiva por três crimes de tráfico de influência, no âmbito do processo Face Oculta, e já começou a cumprir esse pena. O respetivo processo de irradiação já está em curso no Conselho das Ordens Nacionais.
Avaliação do Polígrafo:
|