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| - As palavras não ajudaram ao discurso do primeiro-ministro, mas a ideia ficou clara: o descongelamento integral das carreiras dos professores não vai acontecer. Em entrevista à TVI, esta quinta-feira à noite, António Costa escusou-se de responsabilidades sobre o congelamento das carreiras dos docentes e lembrou alguns dos feitos do seu Executivo: “Além de termos posto o relógio a contar, conseguimos fazer contas para que os professores pudessem recuperar o tempo equivalente ao dos outros funcionários públicos.”
“Há alguma razão para que eu possa fazer por uma carreira específica o que não posso fazer para todas as outras? O país tem que fazer opções”, argumentou Costa, sinalizando que “quase todas as carreiras estiveram congeladas” e que “se o Governo quisesse dar a todas as outras carreiras o equivalente aos seis anos, seis meses e 23 dias que os professores reivindicam, isso tinha um custo para o país: 1.300 milhões de euros de despesa permanente todos os anos. Não é agora, era todos os anos”.
E finalizou: “Não vejo que país tenha condições para acrescentar 1.300 milhões de despesa permanente.”
O valor é insuflado. Mas, além de insuflado, está longe de ser atual: Costa foi recuperá-lo aos cálculos de Mário Centeno, feitos em abril de 2019, e que apontavam para uma despesa de 800 milhões de euros só com a recuperação integral do tempo de serviço dos professores.
“Esta medida tem um impacto na despesa permanente com salários de docentes de 635 milhões de euros, um custo total de 800 milhões de euros se incluirmos as outras carreiras. Representariam 4% adicional de toda a massa salarial do Estado, 4% adicional”, afirmou o então ministro das Finanças, no Parlamento. A somar ao previsto no Orçamento do Estado para 2018, “isto representaria um aumento de 1.209 milhões de euros”.
No entanto, segundo as contas da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), depois de aplicados os descontos em sede de IRS e contribuições para a Segurança Social (no âmbito dos aumentos salariais), o custo baixaria para 567 milhões de euros. Ou seja, menos 237 milhões de euros do que Centeno e vários outros membros do Governo tinham invocado como custo total.
Atualmente, e segundo informação enviada pelo Ministério das Finanças ao Polígrafo, em janeiro deste ano, “o descongelamento de dois anos, nove meses e 18 dias” tem um “impacto permanente anual na despesa pública estrutural de 244 milhões de euros”.
“O impacto adicional atualizado da proposta de recuperação de seis anos, seis meses e 23 dias seria de 331 milhões de euros anuais. A diferença do impacto total anual na despesa estrutural de 575 milhões agora apurados face aos 635 milhões de euros constantes do comunicado de 2019 resulta do efeito das saídas, bem como do impacto de parte do universo dos docentes considerado em 2019 já estar no topo da carreira”.
Assim, “o impacto na despesa estrutural permanente anual com salários da carreira docente atingiria os 635 milhões de euros em 2023 e os 750 milhões de euros em 2025, se consideradas todas as medidas propostas pelos sindicatos (incluindo o fim dos contingentes no acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente)”.
Ao Polígrafo, o Ministério das Finanças indicou ainda que “estes montantes não incluem os impactos de um descongelamento integral nas restantes carreiras da Administração Pública, estimados na ordem dos 200 milhões de euros em 2019″. Contas feitas, estaríamos perante um gasto anual de 775 milhões de euros ou, mediante exigências dos sindicatos, de 835 milhões de euros em 2023 e 950 milhões de euros em 2025.
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Nota editorial: Na sequência da publicação deste artigo, o gabinete do primeiro-ministro explicou ao Polígrafo que António Costa se referia a todas as carreiras da Função Pública (especiais e gerais) e que, por esse motivo, chegou aos 1.300 milhões de euros apontados. Este número, porém, não está inscrito em nenhum documento oficial, nem é conhecida a fórmula como foi obtido. Além disso, esta estimativa (que inclui todas as carreiras da Função Pública) nunca foi utilizada ou calculada por nenhuma entidade independente, uma vez que inclui as carreiras gerais cujo descongelamento decorreu, em 2019, com normalidade. São os docentes, incluídos nas carreiras especiais, cuja progressão depende do curso tempo, que exigem a contagem integral do período do congelamento (daí a referência de António Costa aos seis anos e seis meses). Ministério das Finanças e Governo sempre se referiram a esta medida como incomportável utilizando para tal as previsões para os custos totais do descongelamento integral das carreiras especiais.
O Polígrafo deixa em nota o esclarecimento do primeiro-ministro, lembrando que, em janeiro, o Ministério das Finanças não mencionava, em e-mail enviado à redação, que os 200 milhões de euros calculados em 2019 se referiam ao descongelamento integral das carreiras especiais da Administração Pública:
“Conforme respondido pelo primeiro-ministro na entrevista à TVI, todas as carreiras estiveram congeladas, ou quase todas, sendo exceção as forças de segurança e forças armadas. Em 2018, foi recuperado pelos professores exatamente o mesmo que foi recuperado pelos trabalhadores de outras carreiras. A aplicação a todas as carreiras, dos efeitos de descongelamento do tempo na carreira docente, teria um custo para o país de 1.300 milhões de euros de despesa permanente todos os anos. Tal como comunicado em 2019, o impacto, na despesa permanente, de 800 milhões de euros correspondia à contabilização retroativa do tempo de serviço dos professores de 9 anos, 4 meses e 2 dias, bem como em todas as carreiras similares.”
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Avaliação do Polígrafo:
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