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| - Em recente publicação no Facebook, de 16 de outubro, acusa-se o Executivo de António Costa de mentir quando menciona uma “descida no IRS”. Segundo o autor do post, “com aumentos salariais, em linha com a inflação, mesmo insignificantes, haverá mais dinheiro a ser taxado pelos escalões acima”. Isto porque “o ardiloso Costa não atualizou os escalões do IRS à taxa de inflação prevista”. Em suma, acusa-se, a carga fiscal aumenta.
Mas será mesmo assim?
“Dou um exemplo prático: este ano, um casal que ganhe 36.967 euros é taxado em 28,8%. No próximo ano, do mesmo salário, 36.757 euros, são taxados em 28,7%. Mas, agora, os restantes 210 euros são cobrados no escalão acima com uma ‘taxa marginal’ (ou seja, por cada euro desse ‘lote’) de 43,5%… quando este ano, cada euro (dos mesmos 210 euros) eram cobrados a 37%”, exemplifica-se.
De facto, esta é uma das grandes apostas para 2022: reformular os escalões do IRS de forma a que os impostos pesem menos nas carteiras dos contribuintes e no que estes levam para casa ao final do mês. Mas será que esta medida vai afetar todos da mesma forma? E será que foi isso que o Governo assegurou?
Ao Polígrafo, José Calejo Guerra, da CCSL Advogados e especialista em direito fiscal, explica que esta publicação levanta dois aspetos relevantes: “um relativo aos novos escalões e taxas e outro relativo ao impacto da inflação.”
No que respeita ao primeiro, afirma o advogado, “o comentário é factualmente verdadeiro, mas tenta induzir a uma conclusão errada“. Na prática, no caso de um rendimento tributável de 36.967 euros, em 2021 paga-se 10.660,52 euros de IRS (sem deduções à coleta), ao passo que em 2022 se pagará, com esta proposta, 10.624,80 euros. Assim, “há uma efetiva redução fiscal“, como se verifica pela quebra nos valores.
“O problema nesta análise advém do facto de não referir que, com a proposta para 2022, vai haver uma muito maior parte do rendimento tributado a uma taxa mais reduzida (28.657%)”, indica Calejo Guerra, explicando que “ainda que a taxa marginal máxima seja de facto mais elevada (passa de 37% para 43,5% como referido no post), como a abrangência dos escalões é revista, o montante a que se aplica essa taxa máxima é também muito menor”.
O cálculo do IRS é feito dividindo o rendimento coletável em duas partes, aplicando-se duas taxas distintas a cada uma das partes (uma delas mais reduzida e a outra mais elevada”). O que temos em 2021, alerta o especialista em direito fiscal, é uma “taxa mais elevada inferior à taxa mais elevada em 2022 para o mesmo escalão”. Ainda assim, “o montante sujeito a essa taxa elevada também é bem menor, o que leva a que o encargo fiscal seja efetivamente menor para este escalão”.
Assim, a conclusão que o post pretende retirar é enganadora: sendo factualmente verdadeiro, a intenção parece ser concluir que há um agravamento fiscal, “o que não é verdade”, esclarece Calejo Guerra.
Já no que respeita à inflação, “o problema também não se coloca da forma como é referido na publicação”, ou seja, “é óbvio que um aumento de salários pode levar ao aumento da carga fiscal”, uma vez que é assim que “funciona o sistema: quem recebe mais, paga mais. É essa a natureza do IRS”.
“O problema da inflação é que a poupança fiscal que o Governo pretende introduzir, e que de facto se verifica, é muito residual e acaba por ser inferior à inflação esperada, ou seja, o que se ganha em euros por se pagar menos IRS é consumido pelo crescimento da inflação”, acrescenta o advogado.
Assim, convém ressalvar que a poupança fiscal propalada pelo Governo efetivamente só se verifica “em alguns escalões”, não se podendo falar de um efetivo desagravamento fiscal. Ainda assim, esta distinção foi sempre assumida pelo Governo, que já admitiu ter o seu executivo a considerar alterações ao terceiro e sexto escalões do IRS (patamares de rendimento coletável dos 10.732 euros aos 20.322 euros, e dos 36.967 aos 80.882 euros).
Em suma, o post em análise difunde informação enganadora, com valores factualmente corretos mas com conclusões precipitadas, dúbias e pouco fiáveis.
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.
Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:
Parcialmente falso: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:
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