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| - “Espanha. Novo estudo publicado na ‘BMC Medicine’ aponta que o consumo de mel aumenta o risco cardiovascular“, alerta-se num post de 14 de fevereiro no Facebook, indicado ao Polígrafo com pedido de verificação de factos.
Exibe a imagem de uma notícia com o seguinte título: “O adeus definitivo aos sumos de fruta e ao mel – É que aumentam o risco de sofreres um enfarte” (tradução livre a partir do original em língua castelhana). “Embora sejam naturais, os açúcares livres contidos por estes alimentos são tão prejudiciais como os adicionados, segundo um novo estudo”, acrescenta-se no destaque da notícia.
O estudo em causa foi publicado na revista “BMC Medicine” no dia 14 de fevereiro, tendo enfoque nas “associações entre tipos e fontes de hidratos de carbono na dieta e risco de doença cardiovascular” e foi baseado em dados do UK Biobank (grande base de dados de âmbito nacional).
“A ingestão de açúcar livre associa-se a um risco aumentado de doença cardiovascular total e subtipos de doença cardiovascular, particularmente AVC [Acidente Vascular Cerebral] total, o que apoia a recomendação dietética global de consumir menos de 5% do total energético de açúcares livres. A ingestão de açúcar livre foi associada a um aumento da trigliceridemia em todas as subclasses de lipoproteínas, o que pode explicar em parte o maior risco observado de cardiopatia isquémica, enquanto os mecanismos para um risco total aumentado de AVC permanecem obscuros”, sintetiza-se nas respetivas conclusões.
No pólo oposto está o consumo de fibra que reduz esse risco: “Maior ingestão de fibras foi associada a menor risco de doença cardiovascular total, e a substituição de amido de grãos refinados e açúcares livres por amido integral e açúcares não livres, respectivamente, pode ser protetora para doença cardiovascular. Os nossos resultados suportam a importância do tipo e da fonte de hidratos de carbono consumidos para a saúde cardiovascular.”
Questionado pelo Polígrafo sobre esta matéria, José Pedro Sousa, cardiologista no IPO do Porto e membro da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, adverte que não está comprovado um “nexo de causalidade” entre a ingestão de mel e o aumento de risco cardiovascular.
De acordo com o especialista, o que está aqui em causa são os açúcares livres, isto é, os açúcares popularmente conhecidos como de absorção rápida. Já era sabido que os açúcares livres adicionados geram “subida dos triglicerídeos e a aumento de peso” e isso, consequentemente, aumenta o risco cardiovascular. A novidade está nos açúcares livres naturais – como os que estão presentes no mel ou sumos de fruta – que, afinal, serão tão perigosos quanto os adicionados.
“Os açúcares livres naturais também se associam ao risco e isso é realmente uma novidade. Aquilo que está mais estudado são os açúcares livres adicionados. A grande novidade é na qualidade dos açúcares”, sublinha o cardiologista. “Nos açúcares interessa mais a qualidade do que a quantidade e a qualidade é muito importante especialmente nesta diferenciação de livres e não livres ou, como antigamente se chamava, refinado ou não refinado“.
No entanto, apesar de se verificar uma possível associação ao incremento do risco, o cardiologista ressalva: “Estamos a falar de investigação em nutrição, uma área onde é tradicionalmente muito difícil provar causalidade, diferente do que acontece, por exemplo, nas áreas da farmacologia e cirurgia. Por isso mesmo, os autores do estudo dizem que o consumo do açúcar livre do mel se associa (e não que causa) a um aumento do risco do enfarte do miocárdio. A metodologia do estudo não permite provar nexo de causalidade, apenas levanta esta problemática. É uma suposição com base em evidência, porque o estudo não está desenhado para provar causalidade”.
Além disso, “estamos a falar de aumentos [do risco relativo] de 5% a 6%, ou seja, são aumentos residuais“. Sousa indica que “se um determinado doente consumir mel moderadamente, não vai representar um aumento expressivo do risco cardíaco. (…) Não se pode partir para essa conclusão exagerada de deixar de consumir mel só por causa deste estudo”.
De resto, chama a atenção para outras conclusões do estudo: “O consumo de fibra alimentar associa-se a uma diminuição do risco de enfarte e AVC – o que não é novidade -, os vegetais são dos melhores alimentos que se podem consumir. Têm associação negativa para vários tipos de doenças, incluindo cardiovascular, mas também oncológica, inflamatórias e degenerativas”. Mais, a “substituição de cereais refinados para cereais integrais associa-se também a uma diminuição do risco cardiovascular”.
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Avaliação do Polígrafo:
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