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| - “Governo adota regime de ‘arrendamento compulsivo‘ de casas devolutas”, salienta-se no título de uma aparente notícia, segundo a qual “caberá ao Estado ou ao município ‘pagar ao proprietário a renda que é devida’ e cobrar ‘a renda que resulta do subarrendamento'”.
É a partir desta informação – difundida num post de 18 de fevereiro no Facebook – que se comenta:
“O Estado português tem um prazo de pagamento médio de 75 dias. Os Estados da União Europeia demoram em média 42 dias. A correr bem, o senhorio receberá a renda de janeiro no dia 15 de abril.”
Respondendo a vários pedidos de leitores, o Polígrafo verifica se é verdade ou não que o Estado português demora em média 75 dias a fazer pagamentos, quase o dobro da média da União Europeia.
A alegação em causa ter-se-á baseado numa notícia de julho de 2019 da rádio TSF (pode consultar aqui), com o seguinte título: “Estado demora 75 dias a pagar a fornecedores. É quase o dobro da média europeia.”
“Estudo da Intrum revela redução no tempo que empresas e famílias demoram a pagar faturas mas o país continua pior que a média europeia. Portugal só está à frente da União Europeia no prazo dado a particulares”, informou a TSF. “Os Estados europeus demoram em média 42 dias a pagar aos fornecedores, enquanto em Portugal o prazo é quase o dobro: 75 dias. O valor representa, anda assim, uma melhoria em relação ao verificado em 2017, que era de 95 dias, e ao de 2018, que atingiu 86 dias. Em 2016, as Administrações Públicas pagaram ao fim de 76 dias”.
A notícia é verdadeira, baseando-se no referido estudo da Intrum, uma empresa de serviços de gestão e recuperação de crédito.
O problema é que todos os anos é publicada uma nova edição do “European Payment Report” (ou “Relatório de Pagamento Europeu”, em tradução livre) da Intrum e, aliás, já está disponível a edição mais recente de 2022.
“O ‘European Payment Report’ (EPR) da Intrum, estudo realizado a mais de 11.000 empresas em 29 países europeus, revela que as empresas esperam que os pagamentos em atraso cresçam significativamente nos próximos meses, na sequência do aumento da inflação e das taxas de juro. Cerca de oito em cada 10 empresas afirmam que fortalecer a sua liquidez e fluxo de capital é uma das principais prioridades durante o ano corrente”, destaca a empresa.
“Ano após ano, as empresas vêem cada vez mais os atrasos de pagamento como um obstáculo importante para o crescimento. Os atrasos nos pagamentos estão a dificultar o crescimento das empresas nos países europeus, impedindo o desenvolvimento económico e social da economia em geral”, sublinha-se.
Nesse âmbito indicam-se depois algumas conclusões do relatório, a saber: “quatro em cada 10 empresas dizem que os pagamentos tardios estão a bloquear o crescimento da empresa; duas em cada três empresas dizem que pagamentos mais rápidos por parte dos seus clientes as ajudaria a expandirem as suas operações de produtos e serviços, enquanto que uma em cada duas dizem que as apoiaria a crescer através da contratação de mais empregados; as empresas têm, finalmente, esperança de que a pandemia esteja a chegar ao fim”, na medida em que “cerca de duas em cada três (64%) acreditam que a Covid-19 deixará de ter impacto no seu país dentro de um ano, criando novas oportunidades de crescimento”.
O Polígrafo obteve acesso ao relatório, cedido pela empresa, de forma a verificar os dados referentes ao prazo médio de pagamentos do setor público em cada país.
Em Portugal, no ano de 2022, o prazo médio de pagamentos do setor público ascendeu a 65 dias, ainda assim inferior ao registado em 2018, de 75 dias. Ou seja, a publicação em causa está a difundir informação desatualizada.
Apesar desta melhoria relativa, o Estado português continua a não cumprir o estipulado na “Diretiva 2011/7/UE – Luta contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais“, que estabelece prazos de pagamento de 60 dias no máximo para empresas e de 30 dias no máximo para entidades públicas.
O relatório não apresenta uma média da União Europeia neste indicador (prazo médio de pagamentos do setor público), mas o Polígrafo analisou e recolheu os dados referentes a cada país (24 no total, não incluindo Chipre, Luxemburgo e Malta):
Áustria – 61 dias
Bélgica – 65 dias
Bulgária – 68 dias
Croácia – 57 dias
República Checa – 64 dias
Dinamarca – 68 dias
Estónia – 66 dias
Finlândia – 67 dias
França – 74 dias
Alemanha – 62 dias
Grécia – 62 dias
Hungria – 71 dias
Irlanda – 74 dias
Itália – 70 dias
Letónia – 63 dias
Lituânia – 70 dias
Países Baixos – 62 dias
Polónia – 73 dias
Portugal – 65 dias
Roménia – 65 dias
Eslováquia – 68 dias
Eslovénia – 66 dias
Espanha – 73 dias
Suécia – 66 dias
A partir destes dados calculamos uma média de 66,6 dias. Ou seja, além de ter reduzido o prazo médio de pagamento de 75 para 65 dias, entre 2018 e 2022, Portugal também deixou de estar acima da média da União Europeia (quase o dobro) e posiciona-se agora ligeiramente abaixo – 65 dias para 66,6 dias.
Importa porém ressalvar que o estudo abrange somente 24 dos atuais 27 Estados-membros da União Europeia. Foi desenvolvido entre 17 de janeiro e 13 de abril de 2022, através de inquéritos a um total de 11.007 empresas (em Portugal participaram 333 empresas.
De acordo com a Intrum, “a pesquisa foi realizada através de entrevistas telefónicas e a participação num inquérito online (questionário na web). O questionário foi traduzido para o respetivo idioma nacional”.
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Avaliação do Polígrafo:
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