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| - No passado dia 20 de dezembro, o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS) fez uma conferência de imprensa, em Genebra, com um novo balanço sobre a pandemia declarada em março de 2020, em concreto sobre a nova variante, Ómicron. A dada altura, Tedros Adhanom Ghebreyesus fala da maior capacidade de propagação da nova variante e da necessidade de ter 70% da população de cada país vacinada a meio do próximo ano, para acabar com a pandemia. Defende que sejam priorizados grupos mais velhos, em vez de reforçar a vacinação de crianças. Mas diz “matar crianças”?
A partilha do vídeo desta conferência de imprensa foi sinalizada pelo Facebook como suspeita de estar a divulgar informação errada, já que a legendagem coloca o diretor da OMS a dizer que alguns países estão a utilizar a vacina “para matar crianças”, em vez de “vacinar crianças”.
Na declaração em análise, Tedros, originário da Etiópia, expressa-se em inglês, e quando se ouve a parte das respostas às perguntas dos jornalistas, no vídeo (aqui disponibilizado pela agência de notícia russa Ruptly) ficam algumas dúvidas sobre o que diz o diretor da OMS. No entanto, no site da organização está disponibilizada a transcrição completa desta conferência de imprensa, o que permite clarificar estas mesmas dúvidas.
As primeiras perguntas que surgiram nesta conferência de imprensa foram sobre a vacinação e a dose de reforço. Na resposta a algumas delas, Tedros sublinha a importância de vacinar os mais velhos e os mais vulneráveis e diz que há hoje “novas provas sobre os benefícios” da vacinação nos grupos de idosos, “especialmente acima de 65 e 60 anos”. E, no contexto em que se queixa da falta de equidade na disponibilidade de vacinas no mundo, o diretor da OMS defende que é conveniente administrar a dose de reforço “nos grupos que têm risco de doença grave e morte, em vez do que se vê em alguns países que estão a usá-las para dar reforço às crianças, o que não está certo”.
Numa nota à AFP sobre este caso, a própria OMS esclareceu que “o que aconteceu na segunda-feira [20 de dezembro de 2021], durante a conferência de imprensa, foi que o diretor da OMS hesitou na primeira sílaba da palavra ‘criança’ [‘chil’, de ‘children’, em inglês] e soou como ‘cil/’kil'”. “Ele pronunciou de imediato de forma correta a mesma sílaba, e soou como ‘cil-children. Qualquer outra interpretação disto é 100% incorreta”, previne a OMS.
Aliás, parte da conferência de imprensa é precisamente dedicada à importância da vacinação como forma de pôr fim à pandemia e sobre a desigualdade que se verifica neste processo pelo mundo. “Se quisermos acabar com a pandemia no próximo ano, devemos acabar com a desigualdade, garantindo que 70% da população de cada país seja vacinada até meados do próximo ano”, afirmou Tedros nesse dia.
Nesta mesma altura da conferência, o etíope advertiu que há outras emergências no mundo, para lá da Covid-19, nomeadamente as consequências que a pandemia trouxe no combate a outras doenças. “De acordo com novos dados divulgados este ano, 23 milhões de crianças perderam as vacinas de rotina em 2020. O maior número em mais de uma década, aumentando os riscos de doenças evitáveis como sarampo e poliomielite”, afirmou.
No caso da vacinação infantil para a Covid-19, a posição da OMS é conhecida e pode ser consultada no site oficial da organização. “Existem benefícios em vacinar crianças e adolescentes que vão além dos benefícios diretos para a saúde. A vacinação que diminui a transmissão de Covid nesta faixa etária pode reduzir a transmissão de crianças e adolescentes para adultos mais velhos e pode ajudar a reduzir a necessidade de medidas de mitigação nas escolas”, consta nas conclusões da nota.
A OMS está, no entanto, mais focada na equidade da cobertura da vacinação no mundo, pelo que acautela que, “dada a atual desigualdade global no acesso à vacina, a decisão de vacinar adolescentes e crianças deve levar em consideração a priorização para proteger totalmente os subgrupos de maior risco”. Assim, a OMS defendeu logo em novembro que, “antes de considerar a implementação de séries de vacinação primária em adolescentes e crianças, deve-se considerar a obtenção de alta cobertura de séries primárias — e doses de reforço conforme necessário com base na evidência de redução e otimização do impacto da vacinação — em subgrupos de maior risco, como adultos mais velhos”.
A organização recomenda, por isso mesmo, que, “por uma questão de equidade global, enquanto muitas partes do mundo enfrentam escassez extrema de vacinas, os países que alcançaram alta cobertura de vacinas nas populações de alto risco devem priorizar a partilha global de vacinas Covid-19 por meio da instalação COVAX antes de avançarem para vacinação de crianças e adolescentes com baixo risco de doenças graves”. Recorde-se que a COVAX é uma plataforma que agrega o poder de compra das economias que nela participam para garantir a compra de vacinas para países mais pobres, como forma de conseguir acelerar a cobertura da vacina contra a Covid-19.
Conclusão
Não é verdade que o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde tenha dito que as vacinas matam crianças. A transcrição da conferência de imprensa em análise, publicada na página oficial da OMS, permite constatar que o que foi dito foi que há países a reforçar a vacinação de crianças quando outros ainda não conseguiram vacinar a população de risco. A própria OMS esclareceu que não é possível fazer outra interpretação das palavras do etíope, referindo que Tedros Adhanom Ghebreyesus hesitou na primeira sílaba da palavra “crianças” (children, no original), durante a conferência de imprensa. A OMS tem focado o seu discurso sobre a vacinação contra a Covid-19 na necessidade de uma maior e mais equitativa cobertura da população mundial. No caso, Tedros voltava a sublinhar que a prioridade deve ser para os grupos mais vulneráveis, mas nunca refere qualquer perigo na vacinação de crianças que, aliás, a organização recomendou.
Segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
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