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| - Ao longo dos últimos meses, o caso da bebé Matilde, que sofre de Atrofia Muscular Espinhal (AME) do Tipo 1, destacou-se nas redes sociais através de um apelo público por parte dos pais – com milhares de partilhas acumuladas no Facebook – que visava angariar dinheiro para a compra do medicamento mais caro do mundo, o Zolgensma, considerado como fundamental para o tratamento da menina.
Os pais abriram uma “conta solidária” na Caixa Geral de Depósitos e receberam donativos que alcançaram um valor total de cerca de 2,5 milhões de euros. No entanto, a compra do medicamento em causa foi entretanto assegurada pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), sem custos para os pais da menina.
De acordo com uma recente publicação na página “Matilde, uma bebé especial” (a página que os pais criaram no Facebook e através da qual lançaram o referido apelo público e têm informado sobre a evolução do tratamento da menina), os pais garantem que “os donativos continuam na conta da Matilde” e que pretendem utilizar o dinheiro para ajudar outras crianças “com a mesma doença“.
“Esta conta foi aprovada pelo MAI [Ministério da Administração Interna] e a sua utilização é monitorizada, ainda não sabemos quanto vamos precisar para a Matilde agora nem no futuro… Mas ainda assim e em sofrimento começámos a contactar outras mães e começámos a ajudar“, sublinham os pais, na mensagem da publicação de 28 de agosto. Ou seja, também ressalvam que poderão necessitar dos donativos para tratamentos da Matilde, “agora” ou “no futuro”.
Na sequência da confirmação de que o medicamento e o tratamento da Matilde foram custeados pelo SNS, há quem tenha feito o pedido de reembolso do montante doado aos pais. Segundo informou anteontem o “Jornal de Notícias”, “um dos doadores confirmou já ter pedido o reembolso dos 100 euros que doou, tendo recebido da mãe de Matilde, Carla Martins, a garantia de que isso aconteceria, ainda que sem indicação de prazo”. Ontem, em declarações ao “Observador”, os pais asseguraram que estão a devolver o dinheiro no mesmo dia em que é solicitado pelo doadores.
Vários leitores do Polígrafo questionaram nos últimos dias sobre se é possível pedir a restituição de donativos aos pais da bebé Matilde e se estes são obrigados a devolver o dinheiro quando tal for solicitado pelos doadores.
Para responder a essas questões, o Polígrafo contactou o advogado Paulo Saragoça da Matta, o qual explicou que “a doação é um negócio gratuito e livre, apenas o desaparecimento do propósito para o qual o donativo foi feito inicialmente é que obrigaria à devolução dos donativos. Além do mais, “a eficácia do medicamento não é de 100% e ainda pode vir a ser necessário fazer uso dessas quantias para tratamentos futuros”.
“O pressuposto inicial da doação que era ajudar a criança e outras na mesma situação não desapareceu, pelo que, judicialmente, os pais não podem ser coagidos a devolver a quantia“, concluiu Saragoça da Matta.
Também contactada pelo Polígrafo, a advogada Rita Garcia Pereira apontou no mesmo sentido, afirmando que “a restituição dos donativos seria possível, caso o dinheiro em causa no contrato de doação fosse usado para um outro fim específico que não o da condição inicial. Apenas se as condições não forem claras é que há uma obrigatoriedade na devolução de donativos”.
Em suma, é possível pedir a restituição de donativos aos pais da bebé Matilde, mas estes não são obrigados a fazer a devolução, no estrito âmbito legal, desde que “o pressuposto inicial da doação” não tenha sido alterado. De qualquer modo, importa salientar que os pais garantem que estão a fazê-lo, mesmo sem obrigação.
De facto, esse pressuposto inicial não terá sido alterado, pelo menos tendo em conta a mensagem central do apelo público dos pais que passamos a transcrever: “O objetivo da conta é tentarmos o tratamento que existe nos EUA já aprovado pelo FDA e que pode salvar-lhe a vida, futuras despesas para terapias e tratamentos e, no futuro, o que não precisarmos será para ajudar outras crianças com esta doença“.
Avaliação do Polígrafo:
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