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| - “Parlamento adota lei que proíbe políticos de contratarem familiares… Mas é em França“. Este é o título de uma recente publicação da página “Tuga Press”, já com milhares de partilhas nas redes sociais. Vários leitores do Polígrafo questionam sobre a veracidade desta informação.
“Podia ser em Portugal, mas não é. Isto foi fruto de uma petição com mais de 200 mil assinaturas. Sabias que o Governo de António Costa tem vários membros que são familiares? Em França isso já não vai ser possível. Graças a uma lei aprovada recentemente os políticos deixam de poder contratar familiares”, indica o texto da publicação.
“Rosa Matos Zorrinho, secretária de Estado da Saúde, é casada com Carlos Zorrinho, atual eurodeputado e ex-governante do PS. O atual ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José António Vieira da Silva, é marido de Sónia Fertuzinhos, deputada socialista. Guilherme Waldemar d’Oliveira Martins, secretário de Estado das Infraestruturas, que é filho de Guilherme d’Oliveira Martins, ex-governante do PS, ex-presidente do Tribunal de Contas e atual administrador da Fundação Calouste Gulbenkian. Estes são alguns dos exemplos que existem no Governo de António Costa, a geringonça“, enumera.
“Se isto fosse em França, já seria impossível. O Parlamento Francês aprovou a lei conhecida como lei da moralização da vida política, com votos favoráveis da maioria absoluta. Desta forma, os políticos franceses ficam proibidos de contratar familiares. Com a aprovação da lei deputados, ministros e autarcas locais não poderão empregar familiares como colaboradores, sujeitando-se a uma pena de três anos de prisão e 45 mil euros de multa se o fizerem”, conclui.
Verdade ou falsidade? De facto, em agosto de 2017, o Parlamento da França aprovou a denominada “lei da moralização da vida política“, a qual proíbe os políticos franceses de empregarem familiares. Desde a entrada em vigor dessa nova lei, deputados, ministros e autarcas locais não podem empregar familiares como colaboradores, sujeitando-se a uma pena de três anos de prisão e 45 mil euros de multa se o fizerem.
A “lei da moralização da vida política” em França foi então aprovada num determinado contexto. O recém-empossado presidente Emmanuel Macron pretendia avançar com um projeto-lei para tornar legal, oficial e orçamentado o estatuto de primeira-dama. Essa iniciativa serviria desde logo para que Brigitte Macron, a atual primeira-dama, pudesse assim ter direito a título oficial, cargo, gabinete e salário. Gerou-se uma enorme controvérsia pública em torno desta intenção de Macron, motivando uma petição com centenas de milhares de subscritores que viria a resultar na aprovação da “lei da moralização da vida política” no Parlamento.
Ora, a publicação em análise da página “Tuga Press” parte de uma notícia verdadeira, a referida lei aprovada no Parlamento da França, mas interpreta mal (ou deturpa) o alcance da mesma e acaba por difundir falsidades. A lei em causa proíbe a contratação de familiares como colaboradores, não proíbe a existência de relações familiares entre governantes, ou até entre governantes e deputados ou ex-governantes, atendendo aos exemplos apresentados na publicação.
Ou seja, é falso que a aplicação daquela lei em Portugal impedisse Rosa Matos Zorrinho de assumir o cargo de secretária de Estado da Saúde (funções que entretanto já não desempenha, aliás) apenas porque é casada com Carlos Zorrinho, eurodeputado do PS. Porque evidentemente que Rosa Matos Zorrinho não empregou Carlos Zorrinho como colaborador, nem Carlos Zorrinho contratou Rosa Matos Zorrinho como colaboradora. O mesmo se aplica, tal e qual, a todos os outros exemplos indicados.
Importa porém ressalvar que a lei em causa poderia incidir sobre um outro caso recentemente noticiado em Portugal: a contratação da mulher de Pedro Nuno Santos, atual ministro das Infraestruturas e da Habitação, como chefe de gabinete (isto é, colaboradora) do secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro. Mas mesmo nesse caso há dúvidas quanto à potencial aplicação da lei, na medida em que não se trata de uma contratação direta (ou nomeação) do ministro Nuno Santos.
De qualquer modo, a publicação da página “Tuga Press” nem sequer faz referência a essa situação, focando-se em exemplos do atual Governo que não fazem sentido no âmbito da aplicação da lei francesa.
Avaliação do Polígrafo:
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