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  • Numa altura em que a aplicação StayAway Covid está debaixo de fogo devido à proposta do Governo de tornar a sua utilização obrigatória, uma publicação partilhada no Facebook à boleia desta polémica vai ainda mais longe e sugere que a app de nada serve porque a pessoa que testou positivo ao novo coronavírus ou fica internada no hospital ou fica doente em casa e, como tal, não vai andar com o telemóvel na rua. E se não andar com o telemóvel na rua, o telemóvel não vai avisar ninguém com quem contactou, alega o autor da publicação. Mesmo que o conteúdo do post possa ter alguma ironia, a informação veiculada é totalmente falsa. A publicação, que chegou às 19 mil visualizações, segundo dados do Facebook, enumera ponto por ponto o porquê de a aplicação ser supostamente inútil, mas acontece que metade dos pontos não são verdadeiros, porque não é assim que verdadeiramente funciona a aplicação de smartphone em causa. Não é preciso o telemóvel da pessoa infetada estar na rua para alertar as pessoas com quem contactou, porque esse alerta é feito em relação aos contactos anteriores. Ou seja, o sistema vai avisar toda a gente com quem a pessoa contactou nos 14 dias antes de saber que estava infetada. Segundo se lê no site do INESC TEC, empresa que concebeu a aplicação que está a ser recomendada pelo Governo em Portugal, o funcionamento da aplicação é bem diferente daquele que é referido no post: “A aplicação, uma vez instalada no telemóvel, deteta a proximidade física entre smartphones e informa os utilizadores que estiveram no mesmo espaço de alguém infetado com o novo coronavírus nos últimos 14 dias. Esta informação permite, rápida e atempadamente, um pedido de diagnóstico da infeção, mesmo antes da ocorrência de qualquer sintoma.” Ou seja, assim que uma pessoa testa positivo para a Covid-19, independentemente de ficar em isolamento em casa ou de ficar internada no hospital, se introduzir o código fornecido pelo médico no seu telemóvel, imediatamente o sistema envia um alerta a todas as pessoas que, nos últimos 14 dias, estiveram a menos de dois metros de distância da pessoa em questão durante mais de 15 minutos consecutivos. Quer isto dizer que, ainda que a pessoa infetada fique em quarentena em casa (é, aliás, obrigada a isso), a aplicação alerta todos os contactos mais antigos que a pessoa Covid-positiva possa ter tido antes sequer de saber que estava infetada. É também isso que explica o site da StayAway Covid, no capítulo sobre o funcionamento da app, através de um exemplo fictício: - “José, Manuel, Maria e Ana instalam voluntariamente a aplicação nos seus telemóveis. A aplicação gera identificadores aleatórios em cada telemóvel que são comunicados aos outros telemóveis via Bluetooth, sem revelar identidades pessoais; - O José contraiu o vírus, mas está sem sintomas. O José tem contacto próximo com o Manuel e a Maria. Os telemóveis do Manuel e da Maria gravam os identificadores aleatórios do telemóvel do José. A Ana também se aproximou do José mas manteve o distanciamento social; - O José começa a ter sintomas e faz o teste. Testa positivo ao novo coronavírus e inicia um período de isolamento. Recebe um código por parte do seu médico e, voluntariamente, digita esse mesmo código na aplicação, sinalizando que contraiu o vírus. A identidade do José nunca é revelada; - O Manuel e a Maria, que estiveram próximos do José nos últimos 14 dias, recebem uma notificação no seu telemóvel indicando que estiveram em contacto com alguém a quem foi diagnosticada a Covid-19 e são aconselhados a contactar os serviços de saúde. São considerados contactos de risco elevado; - A Ana não recebe nenhum alerta porque manteve a distância social em relação ao José“. No capítulo das “perguntas frequentes” no site da StayAway Covid, fica claro que a app calcula a probabilidade de contágio através de um critério científico recomendado pelas autoridades de saúde: “Considera-se que a proximidade a menos de 2 metros e durante cerca de 15 minutos com uma pessoa portadora da doença potencia consideravelmente o contágio.” Só se estiverem verificados esses critérios é que a app alerta as pessoas que estiveram a esse nível de proximidade. As críticas que têm sido feitas à aplicação são muitas mas não têm a ver com os problemas levantados pelo autor da publicação. Não se trata de a app ser ineficaz por as pessoas infetadas não andarem na rua. Trata-se, sim, de a app estar a ter problemas de eficácia porque estão a ser facultados poucos códigos por parte dos médicos. Além de que, mesmo entre os códigos fornecidos, são poucos os utilizadores que os estão a carregar na aplicação. Os últimos dados fornecidos pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC), segundo o Jornal de Notícias noticiou este domingo, apontam para apenas 740 códigos gerados pelos médicos e apenas 216 códigos introduzidos pelos utilizadores. Isto num universo global de cerca de 40 mil pessoas que testaram positivo desde que a aplicação se tornou disponível no mercado. Assim, mesmo que o número de downloads da aplicação esteja a aumentar a passos largos — aumentou 140% só no dia a seguir ao primeiro-ministro ter anunciado a proposta de a tornar obrigatória –, tal não significa que a aplicação esteja a ser eficiente. Para isso, é preciso que os médicos forneçam os códigos e que os infetados os introduzam na aplicação num prazo de 24 horas. A 15 de outubro, 1.683.042 pessoas tinham feito download da aplicação. Foram gerados 740 códigos StayAway Covid, mas só 216 chegaram à app. Vítor esperou 18 dias por um Vários têm sido os relatos tornados públicos de utilizadores da app que testaram positivo e que, querendo introduzir o tal código para pôr a app a funcionar, se viram impossibilitados de o fazer porque ninguém, entre as autoridades de saúde, sabia ao certo a quem cabia gerar o código ou como é que o código era gerado. E se o código não é gerado no prazo de 14 dias (e introduzido no sistema 24 horas depois de ser gerado), nada feito — uma vez que a aplicação alerta aqueles que tiveram contacto próximo com o infetado apenas no período correspondente aos 14 dias anteriores à confirmação da infeção. O site da StayAway Covid esclarece, a esse propósito, e citando o protocolo estabelecido com a DGS, que o código deve ser fornecido pelo médico do SNS que acompanhou o doente e que o reencaminhou para a testagem. Ou seja, nesses casos, é o médico que diagnostica que tem o código. Quando o teste é feito no privado, a comunicação do resultado ao doente pode não vir acompanhada do código e, nesse caso, é obrigatório que o médico do privado transmita a informação ao SNS, que “nomeará um médico para fazer o seguimento”. É esse médico que vai ter o código. A polémica adensou-se quando, na semana passada, o primeiro-ministro anunciou, como parte de um conjunto de medidas mais restritivas, que iria propor à Assembleia da República que legislasse no sentido de tornar o uso da aplicação (assim como o uso de máscara na rua) obrigatório. O debate esteve previsto para o próximo dia 23 de outubro, no Parlamento, mas todos os partidos, incluindo o PS, têm dúvidas sobre tornar obrigatória uma aplicação que foi concebida para ser voluntária. A fiscalização é uma das questões mais apontadas, assim como a alegada invasão da privacidade por o conteúdo do telemóvel ser do foro privado, havendo até dúvidas sobre a constitucionalidade da medida. Na sequências das dúvidas levantadas acerca deste passo que o Governo pretendia dar — tornando obrigatória a instalação da app –, o primeiro-ministro pediu ao presidente da Assembleia da República que “desagendasse” a discussão da proposta. “É bom que haja uma discussão profunda, porque há muitas dúvidas e os portugueses continuam a descarregar a aplicação”, defendeu António Costa, na entrevista que deu à TVI, esta terça-feira. Conclusão Apesar de haver muitas críticas à aplicação StayAway Covid, sobretudo à proposta do Governo de a tornar obrigatória, a publicação que se tornou viral no Facebook nos últimos dias assenta em pressupostos falsos. Mesmo que o tom do post até pareça irónico, nos comentários, vários são os utilizadores que se referem ao assunto de forma séria e em jeito de concordância. Não é verdade que a aplicação perca eficácia por o doente infetado ficar em isolamento em casa ou no hospital, e não andar com o telemóvel na rua, uma vez que a aplicação avisa todos aqueles que tiveram contacto próximo com a pessoa infetada nos 14 dias anteriores à pessoa ter dado positivo. Ou seja, a pessoa que testou positivo solicita um código ao médico, introduz esse código na aplicação e, automaticamente, todos aqueles com quem esteve a menos de 2 metros e durante mais do que 15 minutos, nos 14 dias anteriores, recebem uma notificação a sinalizar que estiveram em contacto próximo com uma pessoa infetada. Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é: No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é: FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos. Nota 1: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook. Nota 2: O Observador faz parte da Aliança CoronaVirusFacts / DatosCoronaVirus, um grupo que junta mais de 100 fact-checkers que combatem a desinformação relacionada com a pandemia da COVID-19. Leia mais sobre esta aliança aqui.
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