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| - “De notar que os Capitães de Abril falecidos não têm tido direito a luto nacional. Pessoas que já tiveram: o golpista Spínola. O Imperador Hirohito. Hitler. Papas envolvidos em encobrir abusos das igrejas”, aponta tweet divulgado esta manhã, pouco depois de ser conhecida a decisão do Presidente da República de assinar o decreto do Governo que declara luto nacional no dia 5 de janeiro de 2023, pelo falecimento do Papa Emérito Bento XVI.
Alguns em ditadura, outros em democracia: o critério para declarar luto nacional é pouco claro e, se pertencentes ao mesmo “grupo”, é de esperar que o tratamento seja exatamente o mesmo (ainda que as circunstâncias de alterem). Por ordem cronológica, seguem as situações em que o Governo português declarou luto nacional por figuras polémicas:
Adolf Hilter (1945) – Hitler morria a 30 de abril de 1945. Segundo o Parlamento, “mantendo a ambivalência que caracterizou a política externa portuguesa durante a II Guerra Mundial, dois dias após a morte de Adolf Hitler, o Governo enviou as suas condolências ao representante da Alemanha em Portugal e Salazar decretou luto oficial de três dias, o que gerou protestos internacionais, celebrando depois, na Assembleia Nacional, a vitória dos aliados”.
Imperador Hirohito do Japão (1989) – Hirohito foi, sem surpresas, o mais controverso monarca japonês. Responsável pela invasão à China, o imperador é acusado de crimes de guerra e, inclusive, de ter utilizado armas químicas no país invadido. Em 1989, após a sua morte, Cavaco Silva, como primeiro-ministro, e Mário Soares, como Presidente da República, assinavam o decreto n.º 3-A/89, de 9 de janeiro, que declarou “luto nacional por três dias pelo falecimento de Sua de Majestade, o Imperador do Japão”.
Marechal António de Spínola, antigo Presidente da República (1996) – Assinado por Jorge Sampaio na Presidência, o decreto n.º 23-A/96, de 13 de agosto, considerava a “necessidade da adequada expressão nacional de pesar pelo falecimento do marechal António de Spínola”, sendo devida uma “homenagem pelos Portugueses à memória do militar de carreira distinta, que exerceu as funções de Presidente da República após o 25 de Abril de 1974 e que fica indissociavelmente ligado ao advento do regime democrático em Portugal”. Assim sendo, declarou-se luto nacional por dois dias.
Quanto aos Capitães de Abril, a mais recente polémica surgiu com a morte, em julho de 2021, de Otelo Saraiva de Carvalho: o militar de Abril não teve direito a luto nacional. Para Marcelo Rebelo de Sousa, esta foi uma questão de equilíbrio em relação a outros capitães da revolução de Abril, como Ernesto Melo Antunes e Salgueiro Maia.
Ernesto Melo Antunes faleceu a 10 de agosto de 1999, aos 65 anos, e Salgueiro Maia a 3 de abril de 1992, aos 47. Nenhum dos dois militares mereceu as honras do Governo português através de um período de luto nacional: os primeiros-ministros eram Guterres, em 1999, e Cavaco Silva, em 1992. Na Presidência da República estavam Jorge Sampaio em 1999 e Mário Soares em 1992.
As declarações de Marcelo Rebelo de Sousa em 2021 tentaram explicar o critério, mas deixaram ainda mais dúvidas: “Penso que pesou o facto de figuras que eu já referi, Salgueiro Maia, Melo Antunes, não terem merecido essa homenagem. Olhando para trás, é pena que não tenham merecido. Na altura não ocorreu e, portanto, para não abrir um debate sobre vários nomes cimeiros, qual o mais cimeiro, penso que foi isso que levou o Governo a não dar o passo.”
Esta manhã, dias depois da morte de Bento XVI, a Presidência da República confirmou que Marcelo assinou o Decreto do Governo que declara luto nacional no dia 5 de janeiro de 2023.
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Avaliação do Polígrafo:
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