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| - A desinformação relativa à vacinação vai continuar a chegar às redes sociais, mesmo depois de todas as dúvidas esclarecidas. No dia 16 de junho, uma publicação de Facebook partilhava um longo texto sobre uma suposta ameaça para quem foi vacinado: “As companhias aéreas estão alertando aos clientes vacinados sobre o alto risco de coágulos sanguíneos por meio do mRNA experimental.” Trata-se, no entanto, de uma publicação falsa.
Além desta suspeita levantada pela autora, estão presentes ainda outras preocupações com questões de saúde, como é o caso do suposto “risco aumentado de complicações” para quem voa a uma determinada altitude: derrames, tromboses ou ataques cardíacos. Ora, contactado pelo Observador, o médico cirurgião vascular José Pereira Albino começou por esclarecer os riscos inerentes aos voos. “Até quatro horas de duração, o risco de haver algum problema tromboembólico é muito diminuto. Praticamente não é necessário fazer nada. Quanto a doentes com doença tromboembólica diagnosticada (trombose venosa profunda, por exemplo), normalmente estão medicados e não devem suspender a medicação durante o voo”, refere o especialista.
Ou seja, os riscos transmitidos pela publicação original não se comprovam quando confrontados com conhecimento médico. Por outro lado, quando alguém viaja durante mais de quatro a cinco horas, o possível surgimento de tromboses venosas profundas aumenta, sim, mas não o suficiente para que os passageiros sejam proibidos de viajar. “O número de casos é efetivamente muito diminuto. Este assunto foi escrutinado entre a década de 90 e o início deste século e sabe-se que a quantidade de exemplos é muito pequena”, diz José Pereira Albino. No entanto, para doentes com algum tipo de comorbilidades deste género, é dada uma recomendação: “Para quem não está a fazer nenhum tipo de terapêutica e vai fazer um voo com mais de cinco horas, deve fazer profilaxia — uso de meias elásticas, andar um pouco no avião, beber muita água —, que é prescrita pelo médico que segue essa pessoa”, acrescenta o coordenador da Unidade de Cirurgia Vascular do Hospital Lusíadas, em Lisboa.
Existe também, hoje em dia, a hipótese de tomar um comprimido — um anti-coagulante oral — que permite “proteger de tromboses venosas”. “Como costumo dizer, se tomar esse comprimido ou se tomar uma injeção na barriga, como se fazia antigamente, pode-se fazer a volta ao mundo que não há problema nenhum”, afirma o cirurgião português.
Quanto à ligação entre a toma da vacina e o surgimento de tromboses — um tema que surgiu depois de terem surgido notícias que davam conta de que a vacina da Astrazeneca poderia provocar coágulos no sangue num número reduzido de pessoas —, ela não é possível comprovar. “De momento, não há qualquer evidência de que os doentes vacinados tenham maior incidência de doença tromboembólica venosa. As vacinas da Jansen ou da Astrazeneca causaram um número pequeno mas algo significativo de tromboses venosas em zonas pouco habituais, como o cérebro, mas não existe evidência científica de que quem voe tenha mais probabilidade de as desenvolver”, refere José Pereira Albino. Até porque se determinada pessoa vai viajar, se já está medicado e se tomar o tal comprimido, fica “protegido do surgimento de tromboses venosas”.
Falta perceber se as companhias áreas emitiram algum alerta ou se estão “a discutir o que fazer com os vacinados”. Agora que vários países já estão a desconfinar, as fronteiras terrestres estão abertas e as restrições aéreas começam lentamente a ser levantadas. Ou seja, por exemplo, no espaço europeu, os cidadãos podem viajar desde que cumpram as regras sanitárias estabelecidas pelo país de destino: quarentena obrigatória, teste PCR negativo ou a apresentação do certificado digital.
Já a Agence France-Presse (AFP), que verificou esta publicação considerando-a como falsa, contactou a Associação Internacional de Transporte Aéreo, que representa mais de 200 companhias aéreas em 120 países no mundo, que referiu não ter conhecimento de nenhuma situação em que tenha sido negado o embarque a vacinados por correrem riscos de trombose.
Tal como defendido pelo médico José Pereira Albino ao Observador, o risco de trombose durante um voo pode estar ligado a mais fatores: “A altitude, a pressurização, o ar e a hidratação do passageiro”, referiu Sevestre-Pietri, professora de Medicina Vascular do Hospital Universitário Amiens, à AFP.
Importa também referir, tal como mencionado por aquele órgão de comunicação social, que a Agência Europeia de Medicamento, apesar de ter recomendado que o surgimento de coágulos no sangue deveria constar como efeito secundário muito raro nas bulas de determinadas vacinas, não encontrou qualquer ligação entre as vacinas de mRNA (Moderna e Pfizer, por exemplo) e o risco de tromboses.
Conclusão
Até ao momento, não existe qualquer evidência científica que comprove uma publicação original que argumenta que quem foi vacinado contra a Covid-19 não deve apanhar um voo, por correr o risco de sofrer uma trombose. O médico cirurgião vascular José Pereira Albino explicou ao Observador os vários cenários que existem: até quatro horas de voo, o risco de haver problemas tromboembólicos é muito curto; para doentes deste tipo, normalmente estão medicados e podem voar, desde que mantenham a medicação.
Depois, se o voo for maior em horas de duração, o número de casos de tromboses venosas profunda é efetivamente baixo, tal como amplamente estudado durante a década de 90 e até ao início do século XXI. Pessoas com este tipo doenças podem sempre fazer profilaxia (uso de meias elásticas, beber muita água) ou tomar um comprimido anti-coagulante, por exemplo. Quanto à ligação entre as diferentes vacinas que estão a ser administradas um pouco por todo o mundo e o surgimento de tromboses durante o voo, também não existe qualquer evidência científica.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
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