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| - “Vítor Caldeira fez vários pedidos de audiência a São Bento, mas o primeiro-ministro não lhe respondeu. Telefonou-lhe a comunicar que não vai ser reconduzido“, revelou o jornal “Sol”, na edição de 3 de outubro. O presidente do Tribunal de Contas foi assim afastado do cargo e, na perspetiva de António Costa – “neste momento o vice-presidente assume as funções”, afirmou ontem -, com efeitos imediatos.
Questionado sobre esta matéria, o primeiro-ministro justificou a decisão com o princípio da não renovação de mandatos. “O senhor presidente do Tribunal de Contas, o conselheiro Vítor Caldeira que iniciou estas funções por proposta do atual Governo, concluiu o seu mandato. E de acordo com aquilo que tem sido um princípio que tem sido definido nas relações, nomeadamente do Governo e do Presidente da República, tem vigorado o princípio da não renovação de mandatos nestas funções. Foi assim com a Procuradoria-Geral da República e é assim também com o Tribunal de Contas”, declarou Costa, no dia 5 de outubro.
Confirma-se que na presidência do Tribunal de Contas tem vigorado o princípio da não renovação de mandatos?
De acordo com o Artigo 214º (Tribunal de Contas) da Constituição da República Portuguesa (CRP), “o Tribunal de Contas é o órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas e de julgamento das contas que a lei mandar submeter-lhe, competindo-lhe, nomeadamente: dar parecer sobre a Conta Geral do Estado, incluindo a da segurança social; dar parecer sobre as contas das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira; efetivar a responsabilidade por infrações financeiras, nos termos da lei; exercer as demais competências que lhe forem atribuídas por lei”.
No que respeita ao cargo de presidente, “o mandato do presidente do Tribunal de Contas tem a duração de quatro anos, sem prejuízo do disposto na alínea m) do artigo 133º” que, por sua vez, atribui ao Presidente da República a competência de “nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o presidente do Tribunal de Contas e o procurador-geral da República”.
Apesar do que está disposto na CRP, o facto é que Vítor Caldeira será o primeiro presidente do Tribunal de Contas desde 1977 a cumprir apenas quatro anos de mandato (pode conferir na galeria dos presidentes que está disponível na respetiva página institucional). Mais concretamente, os antecessores João Pinheiro Farinha (1977-1986), António de Sousa Franco (1986-1995), Alfredo José de Sousa (1995-2005) e Guilherme d’Oliveira Martins (2005-2015) exerceram todos o cargo durante 9 a 10 anos, correspondendo a dois mandatos sucessivos.
O facto é que Vítor Caldeira será o primeiro presidente do Tribunal de Contas desde 1977 a cumprir apenas quatro anos de mandato. Mais concretamente, os antecessores João Pinheiro Farinha (1977-1986), António de Sousa Franco (1986-1995), Alfredo José de Sousa (1995-2005) e Guilherme d’Oliveira Martins (2005-2015) exerceram todos o cargo durante 9 a 10 anos, correspondendo a dois mandatos sucessivos.
Quanto à analogia que o primeiro-ministro traçou com a Procuradoria-Geral da República, não é simétrica desde logo no que respeita à duração dos mandatos. De acordo com o Artigo 22º (Procuradoria-Geral da República) da CRP, “o mandato do procurador-geral da República tem a duração de seis anos, sem prejuízo do disposto na alínea m) do artigo 133º”.
Ou seja, o mandato de seis anos do procurador-geral da República é mais extenso do que o mandato de quatro anos do presidente do Tribunal de Contas. Aliás, em setembro de 2018, ao justificar a decisão de não reconduzir Joana Marques Vidal no cargo de procuradora-geral da República, o primeiro-ministro defendeu que “a benefício da autonomia do Ministério Público, o mandato do procurador-geral da República deve ser longo e único“. Como tal, o mesmo argumento não parece ser válido relativamente a um mandato de apenas quatro anos.
Outra quebra na simetria consiste no facto de nenhum procurador-geral da República ter sido reconduzido no cargo desde 1977, ao contrário do que já verificámos na presidência do Tribunal de Contas. De facto, Arala Chaves (1977-1984), Cunha Rodrigues (1984-2000), Souto de Moura (2000-2006), Pinto Monteiro (2006-2012) e Joana Marques Vidal (2012-2018) exerceram todos o cargo durante 6 a 7 anos, correspondendo a um mandato único.
Nenhum procurador-geral da República foi reconduzido no cargo desde 1977, ao contrário do que já verificámos na presidência do Tribunal de Contas. De facto, Arala Chaves (1977-1984), Cunha Rodrigues (1984-2000), Souto de Moura (2000-2006), Pinto Monteiro (2006-2012) e Joana Marques Vidal (2012-2018) exerceram todos o cargo durante 6 a 7 anos, correspondendo a um mandato único.
Concluímos assim que na presidência do Tribunal de Contas não tem vigorado o princípio da não renovação de mandatos. Mais, Vítor Caldeira será o primeiro presidente do Tribunal de Contas desde 1977 a cumprir apenas quatro anos de mandato. E a analogia que o primeiro-ministro traçou com a Procuradoria-Geral da República também parece não ser válida, embora nesse ponto esteja em causa uma leitura política mais subjetiva.
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Avaliação do Polígrafo:
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