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| - O deputado Ricardo Baptista Leite, do PSD, questionou ontem o primeiro-ministro António Costa sobre o aumento do número de pessoas que recebem o salário mínimo nacional em Portugal. Na resposta, Costa disse em tom irónico que a especialidade de Baptista Leite não é “o rigor dos números” e avançou para uma explicação aritmética:
“Se um salário aumenta 40%, as pessoas não ganham menos, ganham mais 40%. As pessoas ganhavam menos, sabe quando? Quando tiveram um salário e foi cortado em 13% e quando tinham uma pensão e foi cortada. Está a ver? O salário mínimo era de 505 euros, hoje é de 760 euros e 760 euros é mais do que 505 euros.”
Na mesma intervenção, dirigindo-se à bancada parlamentar do PSD, o primeiro-ministro acusou:
“O senhor deputado fala em nivelar por baixo, o partido [PSD] que foi contra o aumento do salário mínimo nacional em 2005, foi contra em 2015 e ainda no ano passado… Sim, sim, sim, todos ouvimos, em plena pandemia, Rui Rio dizer que aumentar o salário mínimo nacional era criminoso para a economia portuguesa.”
Os deputados do PSD protestaram ruidosamente, mas será que Costa tem razão?
Desde logo, não encontramos qualquer registo público de que Rio, ex-líder do PSD, tenha dito que “aumentar o salário mínimo nacional é criminoso para a economia portuguesa”. Nem “no ano passado”, nem nos primeiros dois anos da pandemia de Covid-19.
Na realidade, quem proferiu uma afirmação parecida foi Pedro Ferraz da Costa, presidente do Fórum para a Competitividade, em entrevista à rádio TSF emitida no dia 26 de setembro de 2020. Questionado na altura sobre se concordava com a intenção do Governo de aumentar o salário mínimo nacional em 2021, Ferraz da Costa respondeu da seguinte forma:
“Isso neste momento é uma ideia criminosa. Temos uma percentagem muito elevada da população ativa com níveis de escolaridade baixíssimos, uma vergonha no confronto com outros países europeus (e que também não se mudou nos últimos 40 anos) e muitas pessoas se perderem o emprego que têm vão ter grande dificuldade em encontrar onde possam trabalhar validamente. Se começamos a tornar mais difícil ainda a subsistência de empregos pouco produtivos, vamos perdê-los e não sei que alternativa há – isso vai cair sobre a Segurança Social. Acho extraordinário que o ministro das Finanças, não sei se por ter andado pelo Conselho Económico e Social, tenha vindo com essa ideia. Normalmente, em todos os disparates a que assistimos nos últimos anos, o ministro das Finanças era uma voz de bom senso e que chamava a atenção para algumas realidades da vida. Este deu um arzinho da sua graça mas ao contrário. Vamos ver como consegue agora recuar.”
Costa já tinha lançado esta acusação a Rio (e ao PSD em geral) noutras ocasiões, com ligeiras variações na citação e amplitude da mesma. Em abril de 2022, num debate na Assembleia da República, o primeiro-ministro alegou (erradamente) que “durante toda a campanha eleitoral, o PSD não só repetiu que era contra a subida do salário mínimo nacional, como disse mais…”
No dia 13 de janeiro de 2022, em plena campanha eleitoral e no debate frente a Rio, Costa lembrou que o então líder do PSD se “preocupa muito com os números e isso foi-o tornando insensível às pessoas. No momento mais grave desta crise, quando estivemos a preparar o Orçamento do Estado para 2021, foi às jornadas parlamentares do PSD, em outubro de 2020, dizer que era contra o aumento do salário mínimo nacional e que era contra a redução de propinas no Ensino Superior”.
Mas o líder do PSD negou categoricamente a acusação: “Eu não sou contra o aumento do salário mínimo nacional.”
Recuperando o discurso proferido por Rio no encerramento das jornadas parlamentares do PSD, a 21 de outubro de 2020, destaca-se a seguinte transcrição, quando falou sobre o salário mínimo:
“Não há apoio significativo e até há más notícias para as empresas. Já tive a oportunidade de dizer no plenário e dizer em público, porque eu acho que nós devemos estar na vida pública e política com toda a honestidade. Nem que custe dizer as coisas. Eu repito: não acho adequado o aumento do salário mínimo nacional num momento em que as empresas não conseguem vender e não têm receitas. E num momento em que as empresas estão a lutar para não ir à falência e que não têm a capacidade, inclusive, de pagar os salários, porque é o Estado que está a pagar uma parte do salário a muitas delas. Neste enquadramento, é política e economicamente desaconselhável.”
Na mesma intervenção, Rio explicou melhor a sua posição:
“Eu sempre defendi o aumento do salário mínimo nacional. Sempre. Pode discutir-se se mais um bocado ou menos um bocado, isso sim. Mas quando a taxa de desemprego é baixa e a economia está a crescer, nós temos de forçar a subida do salário mínimo nacional para não privilegiar justamente a competitividade pelos baixos salários. Outra coisa é o quadro que nós temos neste momento: as empresas, particularmente as mais pequenas, ou estão com a porta fechada ou estão com a porta aberta, mas não entram os clientes e andam a fazer a ginástica possível. Nós podemos estar a querer beneficiar quem ganha menos, e bem, e estarmos efetivamente a prejudicar quem ganha menos.”
De resto, embora o programa eleitoral do PSD tenha optado por não fixar uma meta no salário mínimo nacional, o partido nunca descartou o seu aumento e defendeu que o tema deveria ser decidido entre os diferentes parceiros sociais, em sede de concertação social, e tendo em conta determinados fatores: “O aumento do salário mínimo nacional deve estar em linha com a inflação mais os ganhos de produtividade.”
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Avaliação do Polígrafo:
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