schema:text
| - “Não há neo-nazis na Ucrânia porque o presidente é judeu”, lê-se numa publicação no Facebook. A ironia é clara: contra as supostas “manipulações dos média”, este utilizador quer garantir que há, sim, neo-nazis nos lugares cimeiros das autoridades ucranianas, o que vai ao encontro da justificação de Vladimir Putin para a invasão da Ucrânia: é preciso “desnazificar” o país.
O argumento deste utilizador, mas que é replicado por muitos outros, tem por base uma série de fotos de um homem com tatuagens relativas ao nazismo, incluindo suásticas. Numa delas, aparece com uma farda. Na legenda, lê-se que o homem, Artem Bonov (um pseudónimo, já que o nome verdadeiro é Artem Zalesov) é a “figura máxima da polícia de Kiev” (outras publicações atribuem-lhe o cargo de vice-comandante daquela força policial). O problema é que não há nada que comprove esta informação.
Desde logo, recorrendo aos sites oficiais da própria polícia da capital ucraniana. No site da direção da polícia de Kiev, encontra-se uma lista dos cinco responsáveis máximos do corpo policial. O responsável máximo não tem, nem pelo nome nem pela fotografia, nada a ver com Bonov: trata-se de Vyhovsky Ivan Mykhailovych, “general da polícia de terceiro escalão”.
Quando a consulta é feita no site da direção nacional da polícia ucraniana, resultado semelhante: quatro responsáveis com os respetivos currículos publicados, nenhum deles coincide com a fotografia ou o nome de Bonov. Neste caso, o chefe nacional da polícia é Klymenko Igor Vladimirovich, “general da polícia de primeiro escalão”.
Por outro lado, segundo a alemã Deutsche Welle, Bonov é conhecido, sim, por ser alegadamente um neo-nazi membro do batalhão Azov — o batalhão paramilitar que surgiu com a revolução ucraniana de 2014 contra o governo de Viktor Yanukovych e a influência de Moscovo na política interna ucraniana, e que acabou por ser integrado nas Forças Armadas da Ucrânia (uma ligação polémica, dadas a inspiração ultranacionalista de alguns dos seus fundadores, e que tem servido como argumento a Putin para justificar a tal necessidade de “desnazificar” a Ucrânia).
Ainda assim, nas últimas eleições legislativas, a coligação dos partidos de extrema-direita ucranianos reuniu apenas 2,15% dos votos, não conseguindo sequer entrar no Parlamento, o que significa que, embora haja de facto alas de extrema-direita no exército ucraniano, essa ala não consegue fazer-se representar politicamente.
Voltando a Bonov: segundo a agência russa Sputnik, o alegado neo-nazi terá conseguido fugir para a Polónia apesar das condições impostas pela lei marcial no país, que o impediriam de sair da Ucrânia por ter entre 18 e 60 anos.
De qualquer forma, não há qualquer prova de que Bonov tenha um cargo de topo na polícia ucraniana e os dados oficiais das autoridades ucranianas desmentem essa informação. Ao Check Your Fact, o especialista em grupos radicais na Europa Anton Shekhovtsov defendeu que “não há qualquer prova de que alguma vez tenha tido uma posição cimeira na polícia de Kiev”. Quanto à farda que veste numa das fotografias, diz que há explicação: “Pode ser explicado pelo facto de ter estado com os Azov, e essa unidade militar estava integrada nas Forças Armadas, por isso tinha o uniforme”.
O brasão que aparece no uniforme seria anterior a 2015, ano em que a insígnia mudou, quando a polícia deixou de estar sob a alçada do ministério da Administração Interna da Ucrânia e passou a estar sob o controlo do Conselho de Ministros. Antes disso, em 2014, as autoridades de Kiev já tinham negado boatos semelhantes sobre neo-nazis que trabalhariam para a polícia e o então assessor do ministro dos Assuntos Internos, Anton Gerashchenko, especificou na sua conta de Facebook que Bonov não fora recrutado para a polícia da Ucrânia.
Conclusão
Não há qualquer prova de que Artem Bonov, alegado neo-nazi com ligações ao batalhão Azov, tenha alguma vez sequer trabalhado na polícia ucraniana. As autoridades do país já desmentiram essa informação e os sites da polícia mostram que Bonov não faz parte do corpo policial de Kiev nem do nacional, muito menos num lugar de topo.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
|