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| - “A posição do Livre sobre a Palestina é clara desde a fundação do partido: pela autonomia do território e pelo reconhecimento do Estado da Palestina. Ao longo dos nossos seis anos de existência foram várias as ocasiões em que pudemos dar conta desta posição e da vontade do Livre em defender a causa palestina na Assembleia da República. Nesse sentido, defendemos que a União Europeia, à semelhança do que já foi feito por uma boa parte da comunidade internacional, reconheça finalmente o Estado da Palestina. No entanto, caso esse reconhecimento continue a ser protelado, achamos que Portugal deve avançar em nome próprio e reconhecer a Palestina como um Estado soberano. Para o Livre, apenas este reconhecimento pode permitir um cenário de paz e coexistência na região e condições de vida dignas para os palestinianos”.
Assim se iniciava o comunicado de 23 de novembro do Grupo de Contacto do Livre, criticando a abstenção da deputada (e também membro desse mesmo Grupo de Contacto que, na prática, funciona como direção do partido) Joacine Katar Moreira relativamente ao “voto de condenação da nova agressão israelita a Gaza e da declaração da Administração Trump sobre os colonatos israelitas” apresentado na Assembleia da República pelo PCP.
“Esse sentido de voto não reflete as tomadas de posição oficiais do partido sobre o tema em questão”, acusaram os dirigentes do Livre, para depois concluírem: “O Grupo de Contacto do Livre manifesta a sua preocupação com o sentido de voto da deputada Joacine Katar Moreira, em contra-senso com o programa eleitoral do Livre e com o historial de posicionamento do partido nestas matérias. O texto apresentado pelo PCP colhe uma posição favorável por parte da direção do partido Livre”.
Ora, esse posicionamento está inscrito em algum programa eleitoral ou documento fundador do partido?
O Polígrafo analisou os programas do Livre referentes às eleições europeias e legislativas de 2019, não tendo encontrado qualquer referência ao conflito israelo-palestiniano, aos colonatos, à autodeterminação dos povos ou ao direito internacional. Quanto ao Médio Oriente, região onde estão situados Israel e os Territórios Palestinianos, há apenas uma referência no programa das eleições legislativas, mas sem relação direta com o conflito israelo-palestiniano.
Essa única referência está incluída na seguinte alínea do programa: “Responder à crise humanitária no Médio Oriente, Magrebe e Mediterrâneo e acabar com a Europa Fortaleza, efetivando um programa europeu digno de instalação e integração de refugiados com partilha de responsabilidades entre todos os países; relançando a Abordagem Global para a Migração e Mobilidade para aprofundar a cooperação com países terceiros e reforçar a proteção dos migrantes; relançando a Política Europeia de Vizinhança, em particular a União para o Mediterrâneo, para fomentar a transformação económica inclusiva e sustentável em todos os países; humanizando o sistema europeu comum de asilo; apoiando a reunificação das famílias; criando uma Operação Europeia de Busca e Salvamento para salvar as pessoas no mar e descriminalizando a solidariedade para com os migrantes; defendendo a livre circulação em toda a Europa e em todo o Mundo; criando um Passaporte Humanitário Internacional”.
O mesmo se aplica ao Programa Político do Livre (datado de janeiro de 2014), assim como ao Roteiro para a Convergência (novembro de 2013) e à Declaração de Princípios do Livre (novembro de 2013), entre outros documentos que estão disponíveis na página do partido.
A única referência que pode ser enquadrada no âmbito do conflito israelo-palestiniano é a declaração do princípio de “universalismo”, determinando que “entendemos como universais os direitos humanos, tanto na sua dimensão civil e política, como económica, social, cultural e ambiental. Defendemos estes direitos sem quaisquer exceções, sejam elas por conveniências táticas, proximidades políticas ou afinidades ideológicas. Deve ser também universal o acesso às provisões públicas na saúde, na educação, e na segurança social”.
Trata-se, porém, de um princípio abstracto, vago, muito distante de um posicionamento estabelecido sobre um conflito concreto.
Concluímos assim que os programas eleitorais e documentos fundadores do Livre não estabelecem um qualquer posicionamento sobre o conflito israelo-palestiniano, embora o comunicado de 23 de novembro do Grupo de Contacto tenha classificado a abstenção da deputada como estando “em contra-senso com o programa eleitoral do Livre e com o historial de posicionamento do partido nestas matérias”.
Atualização: na sequência da publicação deste artigo recebemos a indicação de que no programa do Livre para as eleições legislativas de 2015 há uma referência à Palestina, defendendo o reconhecimento da independência do Estado da Palestina. “Portugal deve lutar por reforçar as posições de consenso dos países membros da CPLP no plano internacional, quer na oposição à pena de morte, quer na defesa da reforma das Nações Unidas, quer no reconhecimento da independência do Estado da Palestina”, lê-se na página 116 do programa, acrescentando que “Portugal deve reconhecer imediatamente a Palestina como Estado soberano e independente“. Posto isto, alteramos a classificação de “Falso” para “Impreciso”, na medida em que não se trata de um documento fundador e não foi com o programa eleitoral de 2015 que Joacine Katar Moreira foi eleita deputada em 2019.
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Avaliação do Polígrafo:
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