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| - O “Daily Mail” foi o primeiro grande órgão de comunicação social a lançar a notícia, a meados deste mês de março: “Os AirPods são perigosos? 250 cientistas assinaram uma petição a alertar para o cancro vindo de dispositivos com tecnologia wireless, incluindo os famosos auriculares sem fio”. O título parece suficientemente explicativo, mas o corpo da notícia avança outros detalhes: a petição “alerta sobre vários dispositivos que emitem radiações por radiofrequência, usadas, por exemplo, no Wi-Fi, nos dados móveis e no Bluetooth. Os AirPods (auriculares sem fio da norte-americana Apple) estão a preocupar, porque são colocados dentro do canal auricular e expõem essas partes sensíveis do ouvido a quantidades perigosas de radiação”.
A polémica não é nova, aliás, o mundo já perdeu a conta às histórias sobre o risco de cancro vindo de dispositivos móveis que emitem radiações. Apesar de a montanha sempre ter parido um rato, agora a história parece ter contornos mais preocupantes, pois, ao contrário dos telemóveis que se aproximam momentaneamente da cabeça, por exemplo, para atender chamadas ou ouvir mensagens, os auriculares sem fios passam horas postos dentro das orelhas a reproduzir música.
É possível concluir que, no artigo original, a preocupação não é com os auriculares da Apple, mas sim com toda a tecnologia que emite aquele tipo de radiação. Os AirPods surgem no texto, porque também a usam, mas são, de longe, os únicos.
Ainda assim, o “Daily Mail” não foi o primeiro a dar conta ao mundo deste novo alerta. O blog de tecnologia “Medium”, com um impacto mediático bastante menor, já tinha feito um artigo onde questionava a segurança dos auriculares sem fio, um texto que cita Jerry Phillips, professor de bioquímica da universidade do Colorado, nos Estados Unidos. A preocupação do especialista relaciona-se precisamente com a colocação dos auriculares no canal auditivo, gesto que expõe os tecidos da cabeça a “níveis relativamente elevados de radiação por radiofrequência”. A consequência, sem qualquer grau de certeza, poderão ser tumores ou outras doenças associadas a um funcionamento celular anormal”. Porém, o professor ressalva que a preocupação não é apenas com os auriculares da Apple: “Há evidência científica que sugere preocupações para a saúde humana pelo uso de todas as tecnologias que operam por frequência rádio”. O autor do artigo prossegue e garante que o especialista não está sozinho e dá, então, o exemplo dos 250 cientistas de 40 países diferentes que assinaram uma petição dirigida às Nações Unidas e à Organização Mundial da Saúde a expressar sérias preocupações sobre “os campos eletromagnéticos não-ionizantes, que é o tipo de radiação emitida pelos dispositivos wireless, incluindo as tecnologias Bluetooth”.
É possível concluir que, no artigo original, a preocupação não é com os auriculares da Apple, mas sim com toda a tecnologia que emite aquele tipo de radiação. Os AirPods surgem no texto, porque também a usam, mas são, de longe, os únicos. De qualquer maneira, e perante a dúvida instalada, não há nada como consultar a fonte original, a petição, para ver o que diz. O resumo da mesma começa por referir que o documento foi lançado no dia 15 de maio de 2015. Ora, os famosos AirPods foram apresentados ao mercado em 2016, pelo que cai logo por terra a teoria de que os cientistas estivessem preocupados com aquele produto em particular.
A partir daqui, as contas são fáceis de fazer: por ser um dispositivo famoso, associá-lo a uma preocupação científica relacionada com cancro, naturalmente que potencia a popularidade dos artigos. Foi isso que fez o “Daily Mail”, de tal forma que, no dia seguinte à publicação, o jornal britânico alterou a notícia, no entanto, tarde de mais, pois já se tinha tornado viral.
Este é o exemplo que quem conta um conto, acrescenta um ponto. Desta vez, um ponto-chave, a marca e um produto Apple, que teve a capacidade de tornar viral uma matéria que, regra geral, suscita pouco interesse, uma petição assinada por cientistas.
O site de verificação de factos “Snopes.com” chegou à fala com Joel Moskowitz, um dos assinantes da petição. O diretor do Centro para a Saúde Comunitária e Familiar da Escola de Saúde Pública da Califórnia garante que os cientistas referem no documento que “as recomendações atuais” em relação aos produtos que utilizam radiações por radiofrequência estão “desadequadas, mas o apelo não especifica qualquer produto ou fabricante”. Os dispositivos listados na petição como exemplos da emissão de campos eletromagnéticos não-ionizantes são, por exemplo, “telemóveis e telefones sem fio e as respetivas bases de carregamento, tecnologia Wi-Fi e antenas elétricas que geram campos eletromagnéticos de frequência extremamente baixa”. Mais, os cientistas que assinaram o documento não dizem que a tecnologia wirelesscausa cancro, apenas expressam a preocupação em relação ao facto de, apesar de as investigações em relação às consequências serem, para já, inconclusivas, existirem algumas evidências científicas dos efeitos nocivos da tecnologia. A petição alerta, assim, para um reforço da proteção da saúde pública por parte da Organização Mundial de Saúde.
Este é o exemplo que quem conta um conto, acrescenta um ponto. Desta vez, um ponto-chave, a marca e um produto Apple, que teve a capacidade de tornar viral uma matéria que, regra geral, suscita pouco interesse, uma petição assinada por cientistas. Ainda assim, não é a primeira vez que os famosos auriculares sem fio da Apple estão debaixo de fogo. Em 2016, logo depois do lançamento, a empresa abordou a polémica. Na altura, a tecnológica fundada por Steve Jobs, garantiu que “os produtos da Apple são, sempre, projetados e testados para preencher ou exceder todos os requisitos de segurança”.
Avaliação do Polígrafo:
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