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| - O mote para a publicação é uma intervenção de Isabel Moreira, deputada do PS, no debate parlamentar de 8 de janeiro sobre conferências neonazis. Recordando as declarações do primeiro-ministro, António Costa, na noite das eleições legislativas de 2019, Moreira afirmou: “Não contamos com o fascismo para nada”.
“Fascismo, em primeiro lugar, é negar a liberdade de ser”, defendeu a deputada, sublinhando que “a democracia só será democracia se o poder for de todas as pessoas”. Mas, segundo o autor da publicação em causa, “Salazar foi um progressista e o PS, como sempre, está atrasado”.
Vamos por partes. Salazar “mandou prender o líder do movimento fascista em Portugal antes sequer que surgisse um partido”?
Trata-se de Francisco Rolão Preto, um dos fundadores do Integralismo Lusitano e líder do Movimento Nacional-Sindicalista (MNS), mais tarde ligado à oposição democrática ao Estado Novo. Inspirado no fascismo italiano, quando este se transformou numa força política, Rolão Preto criou o MNS, anunciado como anti-democrático, anti-comunista, anti-burguês, anti-parlamentar, nacionalista, corporativista e familiar.
Anti-salazarista convicto, acreditava no fascismo revolucionário e apostou no movimento sindical para conquistar as massas operárias. Liderou a extrema-direita que se opôs à governação salazarista na década de 1930 e, posteriormente, aliou-se à oposição democrática para derrubar o ditador.
No dia 10 de julho de 1934, Rolão Preto foi detido, após uma última representação ao Presidente da República, general Óscar Carmona, em defesa de um Governo nacional com a participação de todas as tendências políticas nacionalistas. E tornou-se exilado, residindo durante algum tempo em Valência de Alcântara, Espanha, perto de Castelo de Vide.
“O doutor Salazar proibiu organizações de carácter fascista por decreto logo em 1934″?
De facto, o MNS foi tão efémero quanto Salazar assim o quis, não sobrevivendo à nota oficiosa que que lhe intimou a dissolução e que convidou os seus membros a aderir à União Nacional, partido de Salazar.
Assim, a 29 de julho de 1934, Salazar pôs termo à atividade da facção nacional-sindicalista de Rolão Preto, assinando um decreto que justificou a extinção do movimento fascista por ser “inspirado em certos movimentos estrangeiros de que copiou a exaltação do valor da mocidade, o culto da força na chamada ação direta, o princípio da superioridade do poder político na vida social, a propensão para o enquadramento das massas atrás ou adiante de um chefe. (…) Todos os que se não cingirem a estas diretivas só podem de futuro ser considerados indiferentes ou inimigos”.
No ano seguinte, os nacionais-sindicalistas tentaram mais uma vez derrubar o regime. Mas o golpe falhou e o movimento dos “camisas-azuis”, como ficou conhecido, extinguiu-se.
Em declarações ao Polígrafo, Irene Flunser Pimentel, historiadora, explica que esta alegação “é inenarrável de negacionista, com uma verdade não explicada na sua complexidade“.
“Sim, ele proibiu o Movimento Nacional-Sindicalista (MNS), de Francisco Rolão Preto, em 1934, não por ser fascista (que o era), argumentando que este seguia modelos estrangeiros (sobretudo o fascismo italiano), mas porque não queria qualquer partido que rivalizasse com o seu partido único, União Nacional, fosse de direita ou de extrema-direita”.
De facto, apesar de se tratar de uma proibição, esta não veria precedentes nem subsequentes. Quando inserida no contexto e na frase anexada de Isabel Moreira – recorde-se que falamos de uma intervenção durante o debate sobre a petição pela ilegalização efetiva de grupos de cariz fascista, racista e neonazi – ,deixa de ser verídico que Salazar tenha sido um “progressista”, já que não se tratou de uma ilegalização geral, mas sim de um órgão particular.
Pimentel considera que esta proibição foi “a forma de Salazar controlar qualquer um à sua direita, neutralizando-o“. A historiadora acrescenta ainda que “o MNS era demasiado radical e manifestava-se nas ruas, exigindo que Salazar enveredasse por uma via mais miliciana e fascista”, pelo que o argumento apresentado na publicação em causa “é simplista” e “não dá conta da complexidade da ilegalização do movimento de Rolão Preto“.
“Da mesma forma pode-se dizer que, ao eliminar as SA [Sturmabteilung], através das SS [Schutzstaffel], Hitler e o nazismo não estavam a eliminar uma organização miliciana, mas a neutralizar um movimento passível de rivalizar (com as SS) e incontrolável pelo seu radicalismo de rua”, exemplifica.
Aliás, importa notar que a União Nacional constituiu uma organização política portuguesa frentista, várias vezes considerada fascista, criada para apoio ao regime ditatorial do Estado Novo, não tendo esta sido proibida por António de Oliveira Salazar que, aliás, era seu fundador.
Relativamente ao carácter fascista do regime, Cláudia Ninhos, investigadora no Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, salienta que este “é um debate antigo” da historiografia portuguesa, “em relação ao qual nunca se chegou a um consenso“.
Em Portugal, só no dia 11 de setembro de 1978 é que foi promulgada a Lei n.º 64/78 que proibiu as “organizações que perfilhem a ideologia fascista“.
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.
Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:
Parcialmente falso: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:
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