schema:text
| - No mesmo dia (28 de abril) em que foi conhecida a exoneração do adjunto do ministro das Infraestruturas, Frederico Pinheiro, a SIC e o “Expresso” noticiaram que os Serviços de Informações de Segurança (SIS) tinham sido incumbidos de recuperar o computador de trabalho que aquele ex-membro do gabinete decidira levar para casa minutos depois de João Galamba lhe ter comunicado o “despedimento” (Frederico Pinheiro referiu à TSF que o fez por recear não voltar a ter acesso a informações pessoais e de trabalho, algumas importantes para a sua defesa neste caso).
Segundo o “Expresso”, o contacto para o SIS foi realizado pela Chefe de Gabinete do ministro, Eugénia Correia Cabaço, e dever-se-ia ao facto de, naquele equipamento informático, haver “documentos classificados pelo Gabinete Nacional de Segurança”.
A missão, conforme a versão do próprio Frederico Pinheiro, terá sido cumprida com facilidade: houve um telefonema de um agente do SIS para ele a solicitar a devolução do “portátil” e ambos combinaram encontro em local público para a respetiva entrega. Tudo terá ocorrido na 4ª feira à noite (dia 26).
Entretanto, na conferência de imprensa que deu ontem (dia 29), o ministro das Infraestruturas confirmou essa diligência:
“Nós reportámos ao SIS e à Polícia Judiciária porque são as entidades que tratam da proteção de dados, cibersegurança.”
O SIS podia ser chamado a esta situação e pelo ministro da Infraestruturas?
O Polígrafo contactou Jorge Bacelar Gouveia, constitucionalista e antigo presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (entre 2004 e 2008), que classifica como “completamente ilegal” a intervenção do SIS neste episódio. Para o demonstrar, remete para os dois pontos do artigo 4.º da Lei Quadro (30/84) do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP):
“Artigo 4.º
(Delimitação do âmbito de actuação)
1 – Os funcionários ou agentes, civis ou militares, dos serviços de informações previstos na presente lei não podem exercer poderes, praticar actos ou desenvolver actividades do âmbito ou competência específica dos tribunais ou das entidades com funções policiais.
2 – É expressamente proibido aos funcionários e agentes, civis ou militares, dos serviços de informações proceder à detenção de qualquer indivíduo ou instruir processos penais.”
Bacelar Gouveia sublinha, assim, que uma eventual recolha do computador somente podia ser concretizada por alguma força policial, designadamente a Polícia Judiciária, mas adverte também que a “exoneração apenas tem efeitos a partir da publicação em ‘Diário da República’”, pelo que, à data dos factos (quarta-feira, dia 26), Frederico Pinheiro “ainda não estava formalmente exonerado”.
Independentemente do objeto da intervenção, este especialista refere que “conforme os artigos 17.º da Lei Quadro e 4.º da Lei 9/2007, referente à orgânica do SIRP, apenas o primeiro-ministro ou o ministro da Presidência, caso haja delegação de competências, poderiam dar alguma instrução ao SIS, e nunca outro membro do Governo”, o que confere um cunho de ilegalidade não apenas ao âmbito da ação como à cadeia de comando que a determinou.
Bacelar Gouveia alerta ainda para “a importância da figura do Secretário-Geral do SIRP” (organismo que integra e superintende o SIS), com quem o membro do Governo competente para o efeito deve “articular” todas as intervenções de SIS e SIED que considere necessárias.
“Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (Lei n.º 30/84, de 5 de setembro)
Artigo 17.º
(Competência do Primeiro-Ministro)
Compete ao Primeiro-Ministro:
a) Informar o Presidente da República acerca dos assuntos referentes à condução da actividade dos serviços de informações;
b) Presidir ao Conselho Superior de Informações;
c) Coordenar e orientar a acção dos ministros directamente responsáveis pelos vários serviços de informações;
d) Exercer as demais funções que lhe sejam atribuídas pela presente lei.”
“Lei Orgânica do Secretário-Geral do SIRP, do DIED e do SIS (Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro)
Artigo 4.º
Competência do Primeiro-Ministro
1 – Sem prejuízo dos poderes inerentes à dependência orgânica do SIED e do SIS e das competências atribuídas pela Lei Quadro e demais legislação do SIRP, e pela presente lei, compete, em especial, ao Primeiro-Ministro, aprovar o plano anual de atividades de cada um dos serviços e suas alterações.
2 – No exercício dos seus poderes de tutela, pode o Primeiro-Ministro fixar, por despacho, diretrizes e instruções sobre atividades a desenvolver pelo SIED e pelo SIS.
3 – O Primeiro-Ministro pode delegar no Secretário-Geral qualquer das competências fixadas nos números anteriores.
4 – Depende de despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do membro do Governo responsável pela área das finanças a aprovação de cada um dos projetos de orçamento anual do Gabinete do Secretário-Geral e das estruturas comuns do SIED e do SIS.”
Os próprios sites do SIRP e do SIS confirmam o âmbito e a orgânica hierárquica não compatíveis com a diligência que o Ministério das Infraestruturas solicitou ao SIS.
Pelo que são ilegais tanto o pedido do ministério das Infraestruturas como a consequente ação do SIS de recuperação do computador do ex-adjunto daquele Ministério.
__________________________
Avaliação do Polígrafo:
|