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| - “Sobre César e a mulher de César: o pai de uma colega minha era dono de uma funerária. Quando faleceu, a funerária passou para a minha colega que era filha única. Ela teve de vender a empresa para poder continuar a ser enfermeira. É uma chatice, mas assim o dita a deontologia”, lê-se num tweet divulgado a 5 de outubro.
As declarações têm um enquadramento: Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial, escreveu a 3 de outubro, numa coluna do jornal Público, “A mulher de César é séria”, que nem a ministra nem nenhum dos seus Secretários de Estado alguma vez tiveram “intervenção, direta ou indireta, no processo de aprovação de candidaturas, nem na atribuição de qualquer apoio financeiro”.
Além de se ter sustentado em dois pareceres para afastar a hipótese de “incompatibilidade”, Ana Abrunhosa refere no texto que não acompanha os negócios do marido, cujas empresas receberam fundos comunitários em mais de 200 mil euros:
“Quando o caso em apreço me foi comunicado, por uma questão de transparência, e preventivamente, solicitei um parecer à Direção de Serviços Jurídicos, Auditoria e Inspeção da Presidência do Conselho de Ministros. A resposta que recebi conclui que ‘não se constata eventual impedimento que impeça o cônjuge de eventual Membro do Governo, na área da Coesão Territorial ou outra, de, no âmbito e no respeito pelo quadro legal vigentes, apresentar candidatura a fundos comunitários e receber verbas que sejam aprovadas no âmbito dessa candidatura, desde que não ocorra a realização de qualquer tipo de procedimentos de contratação pública.'”
Sendo um parecer interno do Governo, a ministra recorreu ainda a uma “entidade independente: o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República. As conclusões foram no mesmo sentido: ‘Considerando que a aprovação de candidatura apresentada pelo cônjuge da ministra da Coesão Territorial não é, em princípio, alcançada pelo conceito de contratação pública, nada sugere que fique comprometida a validade do ato que admita a candidatura nem do ato que defira a subvenção.'”
“À mulher de César nunca bastou ser séria, sempre teve de parecer. Mas o problema não é esse. É quando queremos que César deixe de ser César e se torne um cidadão de segunda”, rematou a ministra, em declarações que deram aso a mais polémicas nas redes sociais, como o já apontado facto de enfermeiros não poderem deter agências funerárias.
De facto, de acordo com o artigo 98.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, republicado como anexo pela Lei n.º 156/2015 de 16 de setembro, o exercício da profissão de enfermeiro é incompatível com a titularidade dos cargos e o exercício de pelo menos cinco atividades.
São elas: “delegado de informação médica e de comercialização de produtos médicos ou sócio ou gerente de empresa com essa atividade; farmacêutico, técnico de farmácia ou proprietário, sócio ou gerente de empresa proprietária de farmácia; proprietário, sócio ou gerente de empresa proprietária de laboratório de análises clínicas, de preparação de produtos farmacêuticos ou de equipamentos técnico- sanitários; proprietário, sócio ou gerente de empresa proprietária de agência funerária; quaisquer outras que, por lei, sejam consideradas incompatíveis com o exercício da enfermagem.”
Consultando o artigo 121.º do Regime Jurídico de acesso e exercício a atividades de comércio, Serviços e Restauração Indústria, Licenciamentos e Segurança de instalações (RJACSR) verifica-se que “não podem deter ou exercer, direta ou indiretamente, a propriedade, a exploração ou a gestão de agências funerárias” os “proprietários, gestores ou entidades gestoras de clínicas médicas, estruturas residenciais para pessoas idosas, hospitais ou equiparados e entidades dedicadas ao transporte de doentes, sempre que qualquer uma destas se situe em território nacional, bem como profissionais a exercerem funções nas mesmas”.
Além destes, ficam também proibidos de deter este tipo de serviço os “proprietários, gestores ou entidades gestoras de cemitérios públicos, bem como profissionais a exercerem funções nos mesmos, para uma mesma área geográfica definida sob o ponto de vista de organização administrativa como distrito”, além das “IPSS ou entidades equiparadas cujo enquadramento estatutário acolha o exercício da atividade funerária são excetuadas do disposto no número anterior”.
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Avaliação do Polígrafo:
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