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| - Foi a primeira fake news à escala global: o vírus da Sida tinha sido criado nos Estados Unidos Estávamos em Julho de 1983. A “notícia”, de autor anónimo, foi cirurgicamente plantada pelos serviços secretos russos no jornal indiano “The Patriot” e dizia, logo a abrir: “A SIDA, a fatal e misteriosa doença que tem destroçado os EUA, pode ser o resultado de experiências do Pentágono para desenvolver novas e perigosas armas biológicas”.
Mais:” Alguns especialistas americanos pensam que o Paquistão pode tornar-se no próximo campo de testes para estas experiências.” A finalidade era óbvia: causar alarme social. Dois anos depois, esta falsa notícia começou a ser espalhada por todo o continente africano. Para validarem esta invenção, os serviços russos até encontraram dois “cientistas”, que diziam ter provas de que o vírus fora uma criação laboratorial da CIA, a secreta americana. Porém, foi só em 1987 a Sida ganhou projeção global, através da voz do conhecido pivot Dan Rather, que deu a cara pela notícia nos ecrãs da cadeia de televisão CBS.
A notícia voltou a ser publicada dois anos depois, desta vez no Literary Gazette, e tinha como propósito descredibilizar os Estados Unidos. Segundo o artigo, o vírus tinha sido criado num laboratório militar supersecreto, localizado em Fort Detrick, no estado Maryland, explica a plataforma de fact checking norte-americana Snopes. Como fonte surgia apenas o artigo do “The Patriot”.
A informação espalhou-se pelos quatro cantos do mundo e chegou mesmo a convencer os cidadãos norte-americanos. Rapidamente a teoria de que este vírus era uma arma biológica para acabar com as populações pobres foi alargada e passou a incluir o objetivo de exterminar os homossexuais e os toxicodependentes – os principais grupos afetados por este vírus durante os anos 1980.
Um ano depois da notícia no Literary Gazette, surgiu também um estudo académico, que foi apresentado numa cimeira no Zimbabwe, onde se afirmava que o vírus da SIDA era oriundo dos Estados Unidos e que teria chegado a África e à Europa através de abastecimentos de sangue contaminado. Este estudo foi considerado válido e credível, mesmo tendo sido apresentado por investigadores que não eram especializados no estudo do VIH, explica ainda o Snopes. O artigo veio aumentar a força da desinformação que, entretanto, já corria o mundo.
Afinal de onde vem o vírus da SIDA?
Apesar de ter sido descoberto na década de 80 do século XX por investigadores americanos, a origem do vírus da SIDA remonta aos anos 20 e o primeiro caso detetado foi em Kinshasa, atualmente a capital da República Democrática do Congo. Estudos feitos sobre a origem deste vírus concluíram que o VIH resulta de uma mutação de um vírus que ataca o sistema imunitário dos símios, conhecido como SIV (sigla inglesa para vírus de imunodeficiência em símios), tal como acontece com VIH. Apesar de não ser possível confirmar qual o processo de transmissão do vírus dos símios para os humanos, a teoria mais comumente aceite tem como base a caça e consumo da carne de símios infetados com o SIV.
“Estas teorias da conspiração obviamente não são verdadeiras. São notícias totalmente infundadas e não têm nenhuma evidência científica, do conhecimento e das boas práticas de estudo”, afirma Graça Freitas, diretora-geral da Saúde, ao Polígrafo.
“Parece que uma combinação de fatores em Kinshasa no princípio do século XX criou uma ‘tempestade perfeita’ e proporcionou o aparecimento do VIH”, explicou à Agência Sinc Oliver Pybus, professor do Departamento de Zoologia da Universidade de Oxford e autor principal do artigo “VIH epidemiologia. O início da propagação e ignição epidémica do VIH-1 na população humano”. O VIH-1 da subespécie M é a mutação do vírus mais comum na população mundial.
A expansão para o resto do mundo começou na década de 60 devido à ampliação das redes de transporte e da promiscuidade sexual na região. O vírus chegou ao Haiti aquando do regresso dos profissionais haitianos que trabalhavam na República Democrática do Congo, em 1960 e daí propagou-se para o continente americano. O facto de haver uma grande população infetada no continente africano e no Haiti dá aso às teorias da conspiração que afirma que os americanos queriam reduzir a população mais pobre dessas duas regiões.
“Toda a informação de saúde que puder ser dada é importante, não só sobre a SIDA, sobre as doenças de transmissão sexual, mas sobretudo incidindo sobre a prevenção. Obviamente quando se explica medidas de prevenção explicam-se os mecanismos da doença, como é que aparecem, o que as provoca e toda a informação que puder ser dada, avisa Graça Freitas.
Quando foi descoberto, o vírus foi conotado com uma doença exclusiva da comunidade homossexual, tendo sido posteriormente identificado entre toxicodependentes.
As teorias da conspiração em Portugal
As redes sociais e a internet trazem muitas informação além-fronteiras, transformando o mundo numa Aldeia Global – como defendeu o filósofo Herbert Marshall McLuhan – e muitas destas teorias da conspiração acabam por se propagar por vários países. “Em Portugal essas teorias não têm muito relevo”, afirmou ao Polígrafo Graça Freitas, Diretora Geral da Saúde. “Não estou a dizer que as pessoas não leiam, não vejam ou não saibam o que se passa na internet. Uma coisa é ler coisas na internet, outra é ter uma repercussão interna”, explica.
Em 2017, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), existiam cerca de 36,9 milhões de habitantes que viviam com o vírus de HIV, residindo a maior parte (mais de 69%) no continente africano.
“Estas teorias da conspiração obviamente não são verdadeiras. São notícias totalmente infundadas e não têm nenhuma evidência científica, do conhecimento e das boas práticas de estudo”, reforça ainda a Diretora Geral da Saúde acrescentando que se tratam de “movimentos que aparecem e reaparecem” trazendo ideias que “não são novas”.
No caso concreto da SIDA, é “um dos maiores movimentos na sociedade civil em Portugal” e, por isso, a informação sobre a doença e as formas de contágio é amplamente divulgada junto das associações, centros de saúde e escolas. “É muito importante a informação dos jovens”, reforça Graça Freitas, “toda a informação de saúde que puder ser dada é importante, não só sobre a SIDA, sobre as doenças de transmissão sexual, mas sobretudo incidindo sobre a prevenção. Obviamente quando se explica medidas de prevenção explicam-se os mecanismos da doença, como é que aparecem, o que as provoca e toda a informação que puder ser dada.”
Em 2017, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), existiam cerca de 36,9 milhões de habitantes que viviam com o vírus de HIV, residindo a maior parte (mais de 69%) no continente africano. Quanto ao número de novos casos a OMS estima que o número ronda os 1,8 milhões. Objetivo estipulado é diminuir para menos de 500 mil já em 2020 e menos de 200 mil em 2030.
Avaliação do Polígrafo:
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