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| - “Nós temos que apoiar a produção, porque é a produção que depois nos vai permitir uma melhor procura e, portanto, um melhor consumo”. Foi assim que Rui Rio contrariou a posição de João Oliveira, no debate frente ao deputado comunista que, por seu lado, acredita que “criar empregos, e sobretudo criar melhores empregos, não se faz com medidas dirigidas às empresas, faz-se com medidas dirigidas a dinamizar a produção nacional“.
“Nós precisamos de pôr o país a produzir. Em primeiro lugar para não dependermos do estrangeiro e em segundo lugar para satisfazermos as nossas necessidades, para criar emprego e para criar riqueza. Não há medidas dirigidas às empresas que resolvam este problema”, defendeu Oliveira.
Mas Rio prosseguiu na mesma linha de raciocínio e sublinhou mesmo que falar com o PCP sobre este tema “é muito difícil”, já que este quer “nacionalizar outra vez os setores todos“.
“Isso não é verdade”, refutou o deputado comunista, afirmando que o seu partido está “muito confortável com aquilo que a Constituição prevê de uma economia mista”.
Avançando na intervenção, Rio enumerou uma série de setores estratégicos que o PCP pretende nacionalizar e referiu ainda uma proposta dos comunistas que visa “restringir o capital estrangeiro”:
“Como é que nós vamos pôr as nossas finanças públicas em ordem se vamos fazer uma nacionalização da banca, dos seguros, dos setores estratégicos que vocês querem fazer? Só aí, a ANA, os CTT, tudo isso, independentemente do que foi feito para trás, a EDP, a Galp, só aí… Muito para cima de 50 mil milhões, mas muito para cima. Depende do que quiserem, mas a Águas de Portugal, provavelmente”.
Este plano de nacionalizações, alertou Rio, “levaria à ruina económica, levaria a salários nivelados pelo mais baixo que pode haver”.
Consultando o programa eleitoral do PCP, para as legislativas de 30 de janeiro, verifica-se que o partido quer, efetivamente, reverter a favor do Estado algumas das privatizações feitas nos últimos anos:
“O Governo PS manteve os seus compromissos de classe com o capital monopolista e assegurou-lhe, designadamente por via da legislação laboral, as condições para agravar a exploração; manteve intocáveis os interesses associados às Parcerias Público-Privadas; não reverteu para o controlo do Estado empresas estratégicas como os CTT; cedeu aos interesses de multinacionais como a Vinci, privando o país de um novo aeroporto de Lisboa; deu continuidade à entrega de milhares de milhões de euros à banca privada, como o caso escandaloso do Novo Banco; concedeu vantagens fiscais na venda de barragens à EDP e financiamento à GALP para encerrar a refinaria em Matosinhos.”
Ainda assim, o documento não faz qualquer referência à empresa Águas de Portugal (AdP), propositadamente deixada para último por Rio e acompanhada de um advérbio: “provavelmente”. Mas a questão levantada nas horas seguintes nas redes sociais não foi essa. Afinal, poderia o PCP querer nacionalizar uma empresa que já é pública? E será que o é? O Polígrafo confirma.
No página institucional do Grupo AdP – Águas de Portugal informa-se que este “é o principal grupo empresarial português com atividade nos domínios do abastecimento de água e do saneamento de águas residuais” e que é “detido pelo Estado“. No separador “estrutura de capital” verificamos que 19% do Grupo AdP é detido pela Caixa Geral de Depósitos e 81% pela Parpública, sociedade gestora de participações sociais do Estado.
Ainda assim, e assumindo uma presença alargada no território continental, “prestando serviços a cerca de 80% da população portuguesa através das suas empresas”, são estas empresas que “consubstanciam parcerias entre o Estado e os Municípios, podendo assumir o modelo de sociedades concessionárias de sistemas de titularidade estatal (sistemas multimunicipais), cujo capital social é detido pela AdP SGPS, em representação do Estado, ou de sociedades gestoras de sistemas municipais em regime de parceria pública, com repartição equitativa do capital social”.
Ao Polígrafo, o Grupo AdP esclarece que “estas concessões são integralmente do universo público, uma vez que o concedente é o Estado e as empresas concessionárias são detidas maioritariamente pela AdP – Águas de Portugal, SGPS, S.A. (100% capitais públicos) e pelos municípios abrangidos pelos respetivos sistemas concessionados”.
Em conclusão, embora seja uma empresa pública, do Estado, o Grupo AdP tem várias concessões. Aliás, no que respeita ao setor das águas em Portugal, o Tribunal de Contas (TdC) efetuou uma auditoria cujas conclusões foram divulgadas em fevereiro de 2014. “A auditoria revela que os privados conseguem um lucro excessivo com estes contratos. O TdC concluiu que a maioria dos contratos ‘têm cláusulas que prejudicam o interesse público’. Os privados, de capital nacional e estrangeiro, gerem a água de 23% da população portuguesa”, informou o jornal “Diário de Notícias” na altura.
A auditoria do TdC incidiu sobre 27 concessões adjudicadas a operadores privados que, por sua vez, integram cinco grupos económicos: Aquapor; Compagnie Générale des Eaux (Portugal) – Consultadoria e Engenharia (que operava com a marca Veolia Água)147; Indaqua – Indústria e Gestão de Água; Aqualia Gestión Integral del Agua; e AGS – Administração e Gestão de Sistemas de Salubridade.
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Nota editorial: Artigo atualizado às 13h30 de 19 de janeiro para incluir esclarecimento das Águas de Portugal relativamente às concessões do grupo.
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Avaliação do Polígrafo:
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