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| - A publicação do Instagram tem uma frase em letras garrafais que diz: “Só há insultos agora com o Chega, diz o PS.” Embora os socialistas não o tenham dito exatamente assim, há de facto acusações do PS e outras bancadas de que o ambiente parlamentar piorou desde a chegada do partido de André Ventura ao hemiciclo. O problema não é a frase, mas sim o mosaico de fotografias que acompanha a citação. Para mostrar comportamentos impróprios de vários socialistas, os autores da página recorrem a momentos com contextos diferentes, mas, mais do que isso, chegam a utilizar uma imagem manipulada da ex-ministra da Cultura. Isso torna a publicação enganadora e parcialmente falsa.
Comecemos, precisamente, pela imagem que corresponde a uma manipulação mais grosseira: a de Graça Fonseca. Desde logo, o nome está errado: a ex-ministra da Cultura tem apelido Fonseca e não Freitas (esse corresponde à antiga diretora-geral de Saúde). Mas isso é apenas um lapso. O que é falso é mesmo a imagem. Na verdade, o dedo espetado foi colocado a posteriori através de uma manipulação grosseira de forma a criar um gesto obsceno — que Graça Fonseca não foi captada a fazer.
Uma pesquisa através de plataformas com técnicas de imagem reversa — como o TinEye ou o Google Images — permitiram ao Observador perceber que na fotografia original a antiga ministra da Cultura tem a mão noutra posição. A fotografia foi, aliás, utilizada em vários artigos do Jornal Económico ao longo dos anos para ilustrar notícias sobre a então ministra da Cultura.
A imagem original é da autoria da fotojornalista Cristina Bernardo e foi tirada durante um almoço-debate do International Club of Portugal, a 31 de julho de 2019, em que Graça Fonseca foi a oradora convidada. Na página do Facebook do International Club ainda é possível encontrar outras imagens do evento tiradas pela organização (e também em nenhuma se encontra qualquer posicionamento similar). Em 2020, a então governante já tinha sido vítima da mesma manipulação de imagem, em publicações no Facebook e no Instragam, como na altura o Observador também verificou.
Há outro detalhe que torna a publicação enganadora: mesmo que tivesse feito o gesto (que não fez), Graça Fonseca não estava na Assembleia da República, que é a sugestão que é feita pelos autores da página (que estão a tentar provar que os socialistas também já tiveram comportamentos impróprios no hemiciclo).
Ao contrário do que acontece com Graça Fonseca, a imagem de Mário Centeno de dedo espetado é verdadeira. Foi retirada pelo fotojornalista Manuel Vicente, do jornal i, e foi captada em novembro de 2015 nos poucos dias que Mário Centeno e o seu secretário de Estado Mourinho Félix ainda exerceram a função de deputados nessa legislatura. A 26 de novembro de 2015, Mário Centeno tomaria posse como governante e passou a sentar-se na bancada oposta, a do Governo. Um artigo do jornal i de novembro de 2015, dias depois de a fotografia ser captada, permite aferir a veracidade da mesma:
Na altura, embora seja claro que está a fazer um gesto obsceno (o que pode ser considerado um desrespeito pelos trabalhos parlamentares), o então deputado Centeno tê-lo-á feito numa brincadeira com um colega, não tendo havido ninguém que se tenha sentido ofendido ou que tenha verbalizado esse sentimento de ofensa nessas sessões de novembro. Aliás, o momento só foi captado pelo fotojornalista do i, passando despercebido, por exemplo, às televisões.
O mesmo mosaico tem uma imagem de Manuel Pinho a fazer um gesto taurino no Parlamento, que é igualmente verdadeira. Aconteceu num debate do Estado da Nação, a 2 de julho de 2009, na fase final do primeiro Governo de José Sócrates. Numa altura em que se discutia a situação das Minas de Aljustrel, o então líder parlamentar do PCP, Bernardino Soares, lembrou que Pinho tinha ido àquela localidade “dar um cheque”. As bancadas do PCP e do Bloco de Esquerda indignaram-se com o gesto do ministro. Nos corredores, minutos depois, já Zeca Mendonça, assessor do PSD, circulava com os frames. A oposição não deu tréguas ao então ministro da Economia e nem o ministro e colega de Governo Augusto Santos Silva o poupou. O próprio Manuel Pinho admitia: “Excedi-me”. Numa fase inicial disse que não sairia do Governo, mas acabaria por se demitir ainda nesse dia.
Neste caso, tratou-se mesmo de um comportamento impróprio (e ofensivo), como os autores da publicação pretendem demonstrar, mas com uma diferença para os casos mais recentes: teve consequências diretas e imediatas.
Sobra uma imagem de João Galamba — no mosaico que acima mostramos no canto inferior direito — que também carece de credibilidade. Desde logo, está cortada, sem permitir aferir o momento concreto, nem se o ex-ministro estava mesmo a fazer aquele gesto. Apesar das várias, e polémicas, intervenções de Galamba no hemiciclo, nenhum adversário (nem o Chega, que é insuspeito de simpatizar com o governante) se queixou de alguma falta de respeito do ex-ministro através de gestos obscenos. O que, só por si, é uma diferença relativamente a confrontos abertos entre bancadas que têm perturbado os trabalhos. Ainda assim, também não há nenhuma notícia nem registo nas atas parlamentares de semelhante gesto de Galamba.
Conclusão
O mosaico de imagens mistura imagens verdadeiras de gestos obscenos feitos no Parlamento com imagens que foram ou manipuladas ou cortadas ou descontextualizadas. O exemplo maior de que a publicação é enganadora é o facto de ter havido uma manipulação grosseira de uma imagem de Graça Fonseca, em que é colocado através de montagem um dedo esticado na mão da anterior ministra da Cultura.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ENGANADOR
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
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