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| - “Foi há três anos que a ministra da Justiça fez ‘justiça’ a si própria. O escandaloso aumento de 700 euros para os juízes está agora a dar frutos na carteira da nova pensionista Van Dunem: 6.750 euros por mês. Se isto não é corrupção, o que será então corrupção?”, lê-se em publicação divulgada esta quarta-feira, 13 de abril, no Facebook.
Os registos publicados a 6 de abril deste ano, pela Caixa Geral de Aposentações (CGA), em “Diário da República”, mostram que Francisca Van Dunem vai passar a estar reformada a partir do próximo mês de maio com os já referidos 6.750 euros por mês, mas será que o aumento de 700 euros conseguido para os juízes durante o exercício de funções no Governo se está a refletir neste montante?
Francisca Van Dunem até acumulou, nos últimos meses da legislatura, as pastas da Justiça e da Administração Interna, depois de ter feito toda a sua carreira no Ministério Público, mas a verdade é que se reformou/jubilou como juíza conselheira (Van Dunem tomou posse como juíza do Supremo Tribunal de Justiça a 29 de março de 2016). Aliás, sabe-se mesmo que a ex-ministra optou agora pelo regime de jubilação, que permite atualizações na pensão em função das subidas decretadas para os juízes no ativo:
“A pensão dos magistrados jubilados é calculada em função de todas as remunerações sobre as quais incidiu o desconto respetivo, não podendo a mesma ser superior nem inferior à remuneração do magistrado judicial no ativo de categoria e índice remuneratório idênticos” e os valores “são automaticamente atualizados e na mesma proporção em função das remunerações dos magistrados de categoria e escalão correspondentes àqueles em que se verifica a jubilação.”
Significa isto que, ao requerer este estatuto, o juiz continua a receber o valor bruto correspondente à categoria e escalão a que pertence. Em compensação, é obrigado a manter as mesmas restrições e deveres aplicados à profissão, permanecendo vinculado “aos deveres estatutários e ligados ao tribunal de que fazia parte”, sendo que pode ainda ser chamado a qualquer momento pelo Conselho Superior de Magistratura para prestar serviços.
“A pensão dos magistrados jubilados é calculada em função de todas as remunerações sobre as quais incidiu o desconto respetivo, não podendo a mesma ser superior nem inferior à remuneração do magistrado judicial no ativo de categoria e índice remuneratório idênticos”.
Esta nota é relevante já que, a 6 de agosto de 2019, foi promulgada pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais, pela qual Francisca Van Dunem deu a cara, dizendo que “aquilo que se trata não é de aumentar ou diminuir a remuneração.”, mas sim de “atribuir, a partir de agora, aos magistrados a remuneração a que eles tinham direito e que não recebiam em virtude de uma norma que prevê que o limite máximo da remuneração é a remuneração do primeiro-ministro”.
A alteração ao Estatuto dos Magistrados Judiciais foi aprovada, no Parlamento, a 31 de maio, com os votos favoráveis de PS, PCP, CDS-PP e PEV, permitindo aos juízes conselheiros ter um vencimento superior ao do primeiro-ministro. Votaram contra a alteração à lei as bancadas do BE, do PSD, do PAN e o deputado Paulo Trigo Pereira.
As alterações remuneratórias propostas para a revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais contemplaram aumentos salariais para os juízes conselheiros na ordem de 600 a 700 euros, entre outras situações, beneficiando sobretudo os magistrados colocados nos tribunais superiores.
Importa salientar que o aumento salarial de 700 euros não se aplicou, no entanto, a todos os juízes. O facto é que o valor específico de 700 euros apenas foi aplicado ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. Seguiram-se os juízes conselheiros (como é o caso de Van Dunem) com cerca de 600 euros de aumento salarial, os juízes desembargadores com entre 400 e 500 euros de aumento salarial e vários outros escalões e valores distintos, em alguns casos verificando-se aumentos de cerca de 100 euros.
“Aquilo que se trata não é de aumentar ou diminuir a remuneração.”, mas sim de “atribuir, a partir de agora, aos magistrados a remuneração a que eles tinham direito e que não recebiam em virtude de uma norma que prevê que o limite máximo da remuneração é a remuneração do primeiro-ministro”.
Recorrendo, por fim, aos registos mensais da Caixa Geral de Aposentações, em “Diário da República”, o Polígrafo verificou que as pensões associadas a juízes conselheiros têm vindo a aumentar e que, apesar de em maio de 2019 (quando foi promulgada a alteração ao Estatuto dos Magistrados Judiciais) este valor rondar os 6.129 euros mensais, um ano depois grande parte dos juízes conselheiros aposentava-se com 6.629 euros.
Este valor ainda passou pelos 6.649 euros mensais até atingir, já este ano, os 6.750 euros de que Van Dunem está a beneficiar, bem como outros colegas de profissão tal como o Polígrafo confirmou. Nos anos anteriores a 2019, como 2010 ou 2011, havia já juízes conselheiros a receber 6.129 euros mensais de pensão, o que mostra que as atualizações dos últimos anos têm sido as mais significativas.
Em suma, dizer que Francisca Van Dunem beneficiou de uma iniciativa pela qual deu a cara, enquanto ministra da Justiça, agora que se aposentou, é verdadeiro, mas o raciocínio que leva até esta conclusão é pouco rigoroso. Na verdade, as atualizações na tabela de remuneração dos juízes sempre tiveram impacto nas pensões dos magistrados jubilados (como é o caso de Van Dunem) e, mesmo acabando por se beneficiar a si mesma, o aumento foi transversal a toda a classe.
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Avaliação do Polígrafo:
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