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| - Quando a vaca é gorda de mais, desconfiança e prudência nunca são em excesso. De facto, parece impossível que, com apenas 17 anos, alguém tenha conseguido comprar uma casa com dinheiro que ganhou, milagrosamente, na Internet. Porém, as dúvidas parecem desfazer-se assim que se olha para o logótipo do site que publica a notícia: nada mais, nada menos do que o jornal “Público”, uma das mais prestigiadas publicações diárias em Portugal.
O artigo, lançado há poucos dias, revela que António Guerreiro, o jovem em questão, contou a história de sucesso pessoal no programa “A Tarde é Sua”, apresentado por Fátima Lopes, na TVI. O texto desvenda que o rapaz investiu cerca de 250 euros em Bitcoin, uma moeda digital com grandes valorizações. Em pouco tempo, o montante multiplicou-se tantas vezes que permitiu ao homem, ainda menor de idade, comprar uma casa à mãe.
O presente, generoso, terá sido talvez uma compensação por António ter usado o cartão de crédito da progenitora para fazer o primeiro investimento, como relata a notícia. Um prodígio tal que Fátima Lopes quis testar, em direto, a credibilidade das palavras do rapaz. Os resultados não poderiam ter sido melhores: ganhou praticamente 300 euros em apenas 10 minutos.
Mais abaixo no texto, o leitor fica a saber que o negócio é de tal maneira tentador que até os jornalistas do “Público” quiseram testar a facilidade e a rapidez em multiplicar o investimento inicial. Victoria Oliveira, a suposta autora da notícia, revela até o site onde terá feito o investimento, com direito a hiperligação e uma explicação detalhada de como começar o negócio altamente rentável.
No entanto, chegado o fim da notícia, há peças em que não encaixam numa história fácil demais para ser verdadeira, ou pelo menos para os minimamente perspicazes. Em primeiro lugar, a escassa correção linguística do texto é muito invulgar entre os profissionais do “Público”. Em segundo lugar, a violação dos deveres deontológicos e obrigações legais dos profissionais da imprensa é evidente, já que não é permitido a um jornalista fazer qualquer tipo de publicidade. Em terceiro lugar, a incongruência mais gritante: o endereço do site, em vez de surgir como publico.pt, surge como postukus.com.
Levantadas as dúvidas, o Polígrafo fez várias pesquisas que, em poucos minutos, permitiram concluir que a notícia é falsa e que o site não é a página oficial do jornal “Público”. A primeira das buscas foi pelo nome da jornalista. De facto, o “Público” não tem qualquer colaboradora na redação chamada Victoria Oliveira. A segunda pesquisa foi pelas imagens que aparecem no texto, mostrando António e Fátima Lopes a conversar. Assim que se faz um upload da imagem para o Google, o resultado é revelador: o rapaz, de facto, chama-se António, mas não tem o apelido Guerreiro, é Oliveira e, em vez de ter comprado uma casa à mãe com o dinheiro que ganhou com o investimento em Bitcoin, na verdade foi admitido na universidade com uma média de 19,2 valores. É sobredotado.
A conversa entre o jovem e Fátima Lopes aconteceu, realmente, mas já em agosto de 2019, no programa que a apresentadora conduz.
A última pesquisa desembocou num aviso no verdadeiro site do jornal “Público”, desmentindo o artigo: “Uma página online está a imitar o aspeto gráfico do site do ‘Público’ para publicar um artigo falso, que tem como objetivo levar utilizadores a aderirem a uma plataforma de transação de bitcoins. Trata-se de uma burla a que o ‘Público’ é alheio“.
O alerta é de outubro do ano passado, o que significa que, apesar de antiga, a notícia falsa vai sendo republicada com datas recentes para parecer mais confiável.
Esta não é a primeira vez que plataformas de investimento em Bitcoin recorrem a técnicas fraudulentas para convencer utilizadores de Internet a investir na moeda digital. Os burlões não só utilizam marcas conhecidas de forma a parecerem credíveis, como recorrem à imagem e ao nome de figuras públicas portuguesas.
Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.
Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:
Falso: as principais alegações dos conteúdos são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “Falso” ou “Maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:
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