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| - “Um jardim romântico, histórico e culturalmente único, a pacata Tapada das Necessidades, levianamente negligenciada durante décadas, está agora ameaçada por um projeto de concessão a privados que significaria acesso a carros, demolições e construções de edifícios enormes e desenquadrados”, lê-se no texto que acompanha a petição.
Mais à frente, alerta-se para a aprovação, em 2019, da “cedência a privados da maioria dos edifícios e espaços da Tapada para exploração comercial”, bem como a consequente “degradação da Tapada, ao transformar um local de contemplação, fruição da natureza e silêncio num espaço de eventos, com música, álcool, ruído, abertura de acessos, trânsito e provável estacionamento automóvel, construção de esgotos, movimentação de terras, etc.”.
Em causa está uma concessão da obra, através de concurso público, à empresa Banana Café Emporium, num investimento de cerca de cinco milhões de euros na área de 10 hectares, considerada zona de Reserva Florestal Nacional.
Ora, o projeto aprovado em 2019 visa a construção, a começar ainda este ano, de edifícios como um restaurante, do grupo Banana Café, um quiosque, um parque infantil, um edifício de cowork e um espaço para os “Amigos da Tapada”. Mas será que tem em vista a entrada e saída de carros, ou até mesmo um possível parque de estacionamento?
Não. Embora seja clara na petição em causa a referência ao acesso a automóveis como sendo um dos principais problemas deste projeto, a CML nega perentoriamente essa possibilidade. “Não vai haver trânsito na Tapada, nem acesso e estacionamento de carros. O trânsito e o estacionamento vão continuar a ser proibidos, a não ser para as equipas de manutenção e para eventuais cargas e descargas de material, sempre de forma esporádica e periódica”, assegura a autarquia.
Além deste tópico, os peticionários e a autarquia divergem em vários pontos relacionados com a intervenção. Embora a petição afirme uma “cedência a privados da maioria dos edifícios e espaços da Tapada para exploração comercial”, a CML garante ao Polígrafo que “não há mais nenhum edifício e espaço relevante, com exceção de um quiosque a colocar junto ao grande relvado, que tenha sido concessionado ao vencedor do concurso”.
Ainda de acordo a autarquia, ficam de fora da concessão toda a Tapada, o Moinho e a Casa Amarela dos antigos Serviços Técnicos Florestais.
O intuito da petição é levar a Câmara a rever o projeto, no qual se prevê a construção de um restaurante a ocupar a zona dos antigos edifícios do Jardim Zoológico da Tapada. A CML escreve, no entanto, em comunicado enviado ao Polígrafo, que “parece consensual, pois apenas se discute a sua dimensão, a necessidade de na Tapada existir uma cafetaria/restaurante para uso da população em geral, bem como um local abrigado para atividades culturais e pedagógicas, nomeadamente de crianças”.
De facto, os peticionários esclarecem que nada os move “contra a abertura de uma pequena cafetaria com esplanada no moinho de vento e anexo, junto da portaria do topo Norte, por exemplo”, mas em momento algum fazem uso da palavra restaurante como uma possível solução para aproveitamento do espaço.
Um esclarecimento de José Sá Fernandes, vereador da CML com a pasta do Ambiente, garante ainda que “não só se vão recuperar e preservar, na íntegra, os elementos patrimoniais edificados relevantes, como é o caso dos seis torreões do denominado Jardim Zoológico, como o edifício que entre eles se vai colocar, em substituição da antiga Casa dos Serviços Florestais, sem valor arquitetónico, que ali existe e que apresenta risco de ruína, está devidamente enquadrado, conforme parecer da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC).”
O debate esteve, de resto, em cima da mesa em novembro de 2019, em Assembleia Municipal, quando o Partido Comunista Português (PCP) exigiu, através de um pedido de suspensão do projeto, que se iniciasse “junto da população, com a colaboração da Junta de Freguesia da Estrela, uma auscultação da população e das Associações ligadas ao ambiente e preservação do património, a fim de definir quais as prioridades de equipamentos para usufruto da tapada, minimizando o impacte dos mesmos”. Esta proposta foi rejeitada com votos contra do PS, do PSD e do deputado municipal independente Rodrigo Mello Gonçalves.
Ao Polígrafo, os vereadores do PCP na CML enviaram uma nota de imprensa, na qual consideram que, com a proposta aprovada em 2019, com o voto contra dos comunistas, “o que se pretende mais uma vez é entregar a um privado a exploração de um jardim histórico e importante numa zona da cidade onde não existem praticamente espaços verdes”.
Os vereadores não negam a “pertinência da reabilitação da Tapada”, assim como não deixam de lamentar o seu “abandono, a falta de instalações sanitárias e de bebedouros”. Ainda assim, “não se vislumbra que esta intervenção vá ao encontro desta necessidade”, explicam.
Mais lamentam que todo o processo tenha sido “conduzido sem participação da população residente e que são os principais utilizadores do espaço, nomeadamente, fazendo os tradicionais piqueniques da Tapada, passear e recreio de crianças”.
Em resposta a esta alegação, referenciada também na petição, a autarquia assegura que a discussão ainda não está encerrada: depois de concluído o “levantamento arbóreo, o relatório de inventário e diagnóstico da vegetação, assim como a avaliação do estado dos elementos artísticos do jardim”, será então discutido o Plano de Recuperação e Gestão, que “permitirá debater futuros usos para os restantes edifícios da Tapada”.
O PCP duvida, no entanto, da “utilidade da construção de equipamentos, de que é exemplo o auditório, no serviço à população”, referindo que “é particularmente chocante que se proponha um centro interpretativo da Tapada, ao mesmo tempo que se promove a demolição de estruturas históricas e simbólicas deste espaço, como as do antigo Jardim Zoológico”.
Em suma, o projeto da Câmara Municipal de Lisboa para a renovação da Tapada das Necessidades consuma algumas intervenções que não convencem quer os peticionários, quer alguns vereadores da CML. Ainda assim, é falso que nele esteja incluído o “acesso a carros” ou mesmo o “estacionamento automóvel”: a autarquia garante que o trânsito e estacionamento vão continuar a ser proibidos, a não ser para as equipas de manutenção e eventuais cargas e descargas, intervenções de necessidade esporádica.
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Avaliação do Polígrafo:
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