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| - “A cada burrada do Putin, o rublo despenca – invasão da Geórgia, tomada da Crimeia, e agora Ucrânia. Quanto maior a burrada…”, maior a queda. O raciocínio foi deixado incompleto propositadamente neste tweet publicado na segunda-feira, 28 de fevereiro, onde se incluiu um gráfico cuja fonte, “Refinitiv”, é um fornecedor global de dados sobre o mercado financeiro.
Esses números, adaptados para gráfico pelo jornal britânico “Financial Times“, representam as quedas e pontos altos do rublo desde 2000, quando Vladimir Putin assumiu pela primeira vez o cargo de Presidente da Rússia, sucedendo a Boris Ieltsin, o primeiro Presidente russo depois da dissolução da União Soviética, em 1991.
Olhando para os anos que se seguiram, já na década de 2000, não se pode dizer que Putin tenha herdado uma má posição no que toca à cotação do rublo. As quedas face ao dólar norte-americano foram quase insignificantes até 2008, tendo aliás registado uma subida forte nesses últimos quatro anos (entre 2004 e 2008). Então, porque é que a linha cai para não mais voltar a subir?
A liderança de Putin parecia ter chegado ao fim no Verão de 2008. A verdade é que entre 7 de maio desse ano e 7 de maio de 2012, Putin assumiu o cargo de primeiro-ministro da Rússia, retomando a Presidência no mesmo dia em que deixou o Governo.
Ora, enquanto primeiro-ministro, um cargo que de resto já tinha assumido antes mesmo de se tornar Presidente, Putin foi substituído na Presidência por Dmitri Medvedev. Foi durante este mandato que a Rússia e duas regiões separatistas da Geórgia bombardearam aldeias georgianas, que não ficaram paradas e responderam através das forças armadas presentes na região.
O cessar-fogo, a 12 de agosto de 2008, levou à retirada, semanas depois, das forças russas nos territórios da Geórgia, país que acabou mesmo por perder o controlo que detinha em partes da Abecásia (25%), que é agora uma república autónoma, e da Ossétia do Sul (40%), reconhecida como independente desde esse mesmo ano.
Nesse período, e nos anos que se seguiram, o rublo perdeu, efetivamente, muito do seu valor face ao dólar norte-americano, aproximando-se dos 40 rublos por dólar norte-americano. Poderia dizer-se que esta não deixa de ser uma guerra protagonizada por Putin, que ainda assumia um cargo de extrema importância na Rússia, ou uma guerra por si só, mas a verdade é que as alegações presentes no tweet perdem força neste intervalo histórico.
A próxima “burrada” explícita na publicação, e no gráfico a ela anexado, é a tomada (ou anexação) da Crimeia pela Rússia, protagonizada, essa sim, pela Rússia de Putin e pela Ucrânia, em março de 2014. Importante para os russos do ponto de vista geopolítico, a Crimeia foi simbolicamente cedida à Ucrânia por Nikita Khrushchov, líder da União Soviética entre 1958 e 1964.
O problema, que até então nunca tinha sido levantado, até pelo óbvio e já mencionado carácter simbólico do ato (entregar a Crimeia à Ucrânia não atrapalhava a relação da Rússia com este território), surgiu já em 1991, com a dissolução da União Soviética e com a mais tardia oficialização de uma Crimeia independente da Ucrânia e a sua anexação à Rússia, já em 2014. Um jogo geopolítico que não foi reconhecido por vários países e que motivou noutras regiões (Donetsk, por exemplo) uma vontade de mimetizar o que acontecera com a Crimeia.
Durante esse momento de crise separatista na Ucrânia, a Rússia de Putin sofreu sanções económicas que surtiram efeitos logo em 2014 e 2015, com a sua moeda a afundar e a atingir os cerca de 70 rublos por dólar norte-americano, como se pode observar no mesmo gráfico.
Ainda durante 2015, e por uma provável resposta imediata do banco central russo às sanções impostas, o rublo volta a subir. Mas torna a cair ao longo dos anos seguintes, até atingir um mínimo histórico em fevereiro de 2022. Segundo o “Financial Times”, o rublo caiu para quase 118 em relação ao dólar norte-americano nas negociações da última segunda-feira, 28 de fevereiro. Os dados da Bloomberg revelam ainda que a taxa de câmbio recuperou para cerca de 105 rublos, naquilo que os participantes do mercado descreveram como condições de negociação profundamente tensas que dificultavam a venda de estrangeiros.
Como forma de colmatar perdas, o banco central russo terá subido os juros para mais do dobro, além de ter já imposto controlos de capitais. Até agora, o efeito mais visível das sanções económicas ocidentais à Rússia foi mesmo a cotação do rublo, que caiu até aos 29% nesse dia de negociações.
Citados pelo “Financial Times”, alguns analistas da bolsa prevêem que estas sanções possam causar danos duradouros na Rússia de Putin: “Simplificando, a capacidade da Rússia de fazer transações com qualquer instituição financeira ao nível global será severamente prejudicada, porque a maioria dos bancos internacionais em qualquer jurisdição utiliza o Swift”, escreveu George Saravelos, analista do Deutsche Bank, num comunicado aos clientes.
“Os mercados monetários podem sofrer alguma deterioração nas condições de financiamento, esta semana, devido ao impacto incerto de um congelamento de ativos na liquidez global. Seria de esperar que o Banco Central Europeu, o Fed [dos EUA] e outros bancos centrais interviessem para fornecer um poderoso apoio, se necessário”, afirmou.
Em suma, é verdade que o rublo registou quedas significativas a par com episódios de conflito militar protagonizados pela Rússia. Ainda assim, importa fazer o parêntesis e explicar que a guerra na Geórgia não aconteceu com Putin na Presidência russa, mas sim (formalmente) enquanto primeiro-ministro, isto num regime presidencialista.
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Avaliação do Polígrafo:
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