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| - O que estão compartilhando: vídeo em que Alexandre Garcia diz que o prefeito de Bento Gonçalves vai fazer busca ativa por beneficiários do Bolsa Família na cidade para incluí-los em um programa de emprego. Segundo Garcia, “você não vai mais ganhar Bolsa Família se você se recusa a trabalhar”.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Garcia se refere à lei 7.126/2025 sancionada em Bento Gonçalves (RS). Ela prevê aplicação de multa de R$ 7,2 mil e corte imediato do benefício para quem for pego utilizando dados falsos e cometendo fraudes. A lei também prevê contato com os beneficiários para inserção em programa de vagas de trabalho.
Não há na lei municipal qualquer menção à exclusão do programa as pessoas que estiverem com situação regular. O principal critério para acesso ao Bolsa Família é uma renda de até R$ 218 por pessoa da família. Estar desempregado não é um critério, e quem tem o benefício pode trabalhar.
Recentemente a Defensoria Pública da União (DPU) apontou inconsistências na lei e pediu a fiscalização de outros órgãos. O impasse acontece porque, em tese, o município estaria extrapolando a competência federal ao criar regras municipais sobre um programa que é nacional.
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Saiba mais: O conteúdo publicado no TikTok mostra trecho de um vídeo do jornalista Alexandre Garcia comentando sobre a lei 7.126/2025 sancionada no município de Bento Gonçalves no início deste ano pelo prefeito Diogo Segabinazzi Siqueira (PSDB). Garcia faz elogios ao texto, que prevê coibir fraudes no programa social Bolsa Família ao aplicar multas a quem for descoberto usando dados falsos para conseguir o benefício. A lei prevê também incentivos de apoio a empregos no município para beneficiários.
A Defensoria Pública da União (DPU) questionou a lei alegando “vícios de inconstitucionalidade”. Ao opinar sobre a decisão da DPU em seu canal no YouTube, em 27 de janeiro, Alexandre Garcia desinforma sobre a proposta, dizendo que quem se recusar a trabalhar perderá o benefício.
“(O município) faz o levantamento de quem ganha a Bolsa Família, (detecta) quem tem rigidez, saúde física, mental, musculatura, juventude, capacidade, possibilidade de trabalhar e pergunta porque não quer trabalhar. ‘Ah, não consigo emprego’. Ok, você vai entrar num programa aqui que vai conseguir emprego. O sujeito diz ‘Eu não quero emprego, Bolsa Família está bom’. Então você não vai ganhar mais Bolsa Família se você se recusar a trabalhar”, disse o jornalista no vídeo.
Desemprego não é critério para adesão ao Bolsa Família
A fala é enganosa. O Bolsa Família, programa federal de transferência de renda, tem como principal regra que a renda de cada pessoa da família seja de até R$ 218. Também é preciso estar inscrito no Cadastro Único para ter direito ao benefício. Quem responder aos requisitos pode receber o benefício, mesmo que tenha um emprego.
O programa conta também com uma regra de proteção que permite a famílias que ultrapassam o limite de renda continuarem recebendo 50% do valor do Bolsa Família, por um período de até dois anos. Segundo o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, a regra de proteção serve para as famílias beneficiárias se estabilizarem no mercado de trabalho.
O que é o projeto de Bento Gonçalves e para quem se destina?
A lei foi sancionada com o objetivo de coibir fraudes no Programa Bolsa Família no município de Bento Gonçalves (RS). Segundo o texto, o beneficiário do Programa que for flagrado utilizando dados falsos ou informações falsas está sujeito a:
Corte imediato do benefício;
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Aplicação de multa administrativa no valor de R$ 7.2000;
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Inclusão em programa municipal de orientação para inserção no mercado de trabalho.
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Ainda segundo a norma, o dinheiro da multa será destinado integralmente ao Fundo Municipal de Assistência Social, “para reforçar as políticas públicas voltadas à população em situação de vulnerabilidade”.
Por que a defensoria pública questionou o projeto?
Em 20 de janeiro, a Defensoria Pública da União (DPU) pediu análises da lei para a Procuradoria-Geral da República (PGR), ao Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) e à Procuradoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul. O órgão acredita que a lei de Bento Gonçalves possui “vícios de inconstitucionalidade”. O órgão destacou:
Violação à competência legislativa: segundo a DPU, a Lei 7.126/2025 extrapola a competência federal ao legislar sobre um programa federal de transferência de renda e ao criar sanções que não se aplicam no resto do País;
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Ofensa à dignidade da pessoa humana: as multas e corte do benefício foram vistos como comprometedoras para o “mínimo existencial de pessoas em situação de vulnerabilidade”. Além disso, a Defensoria destacou que o Bolsa Família
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O Bolsa Família já possui meios próprios de verificação de irregularidades no acesso ao benefício: segundo decreto federal 12.064/2024, a unidade familiar que prestar informações falsas ao CadÚnico têm o dever de ressarcimento. O ato pode resultar em inscrição na Dívida Ativa da União e o impedimento temporário de reingresso ao programa.
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O mesmo decreto delega ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome a definição da aplicação do ressarcimento. A DPU destacou também a Lei 14.601/2023 que prevê “nas hipóteses de denúncia ou de constatação de indício de fraude cometida por agente público durante a inscrição da família no CadÚnico, as informações serão enviadas para apuração da autoridade policial competente.”“Assim, compreende-se que o procedimento estabelecido pela Legislação Municipal não apenas contraria o regramento Federal e nacional do tema, mas também pode gerar responsabilizações além dos casos legais, em violação aos princípios constitucionais” destacou a DPU.
Desproporcionalidade das sanções e falta de isonomia: A DPU apontou também que o corte imediato do programa por meio da Secretaria Municipal pode violar o princípio de proporcionalidade e artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, que diz: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
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Com isso, a DPU solicitou:
à PGR: que avalie a possibilidade de apresentar uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ao Supremo Tribunal Federal (STF);
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ao CNDH: que avalia a possibilidade de adotar providências;
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à Procuradoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul: que avalie a possibilidade de entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade.
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Procurada, a Prefeitura de Bento Gonçalves informou que não recebeu nenhuma notificação até o momento e que a legislação segue em vigor.
Alexandre Garcia foi procurado, mas não respondeu.
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