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  • As dúvidas sobre os benefícios do consumo de insetos têm sido discutidas nos últimos anos. E foram impulsionadas, sobretudo, pela aprovação do consumo em diversos países europeus, incluindo Portugal, de várias espécies de insetos. Sobre este assunto, começou a circular nas redes sociais uma publicação que, à primeira vista, pretende explicar a razão pela qual os insetos não devem ser consumidos. A publicação diz então o seguinte: “Os insetos são constituídos por quitina, que não é processada pelo nosso estômago, mas é um polissacarídeo muito do agrado dos carcinomas, parasitas, fungos e outros que são altamente nocivos para a saúde humana. Os insetos contêm esteróides metamórficos, especialmente ecdysterona. Os insetos não são adaptados ao consumo humano. Apenas as aves estão adaptadas para o consumo de insetos. Apenas o aparelho digestivo das aves está adaptado à ingestão de insetos, é completamente diferente do nosso”. Essa seria, segundo a publicação, a “opinião do cientistas Dr. Rob Schneider”. Há partes deste texto que estão corretas. A quitina faz, de facto, parte da composição dos insetos e é também um polissacarídeo — tipo de açúcar bastante comum também nas plantas e vegetais. A seguir à celulose, a quitina é o biopolímero que existe em maior quantidade na natureza e, além dos insetos, faz parte de legumes, frutas – alimentos que sempre foram ingeridos. E é também considerada uma fibra alimentar não digerível, o que não significa, no entanto, que seja prejudicial. Pelo contrário: ajuda a equilibrar a flora intestinal. Aliás, nos últimos anos foram publicados vários estudos científicos sobre o consumo de insetos. “Os insetos podem ser uma excelente fonte de fibra para a dieta humana”, lê-se no ensaio divulgado pelo NFS Journal, em 2020, sobre os “benefícios e preocupações com a segurança alimentar associados ao consumo de insetos comestíveis”. E mais: “A quitina ajuda a prevenir a incidência de doenças microbianas transmitidas por alimentos e pela dificuldade na digestão de alimentos.” Ou seja, a quitina pode não ser absorvida durante o processo de digestão, no estômago, mas é no intestino que põe em prática as suas funções mais benéficas. Neste estudo, os investigadores explicam ainda que microorganismos como as salmonelas podem ser reduzidos se a quitina estiver presente. A propósito da digestão da quitina, Mareike Janiak, uma investigadora que publicou um estudo sobre as enzimas que decompõem a quitina, na revista Molecular Biology and Evolution, explicou à AFP que este polissacarídeo é semelhante à celulose que se encontra, por exemplo, no aipo e que também não é decomposta no processo de digestão. “Continuamos a comer alimentos como o aipo, e é saudável para nós”, disse a investigadora, acrescentando que “a falta de fibra insolúvel pode causar prisão de ventre, por exemplo”. “Os humanos, como muitos outros primatas, têm um gene funcional para esta enzima, por isso até é possível que possamos, de facto, processar a quitina no intestino. Dito isto, mesmo que não pudéssemos, a quitina ia continuar, simplesmente, a passar pelo nosso corpo, como acontece com a celulose do aipo e de outros vegetais.” Importa agora olhar para a última parte da publicação, em que é dito que “os insetos contêm esteróides metamórficos, especialmente ecdysterona”. É verdade. A ecdysterona é um esteroide natural e está associada ao crescimento muscular. É por isso que é utilizada tantas vezes em suplementos desportivos, já desde o século passado. Fora dos suplementos, e obviamente em quantidades muito mais reduzidas, a ecdysterona está presente, por exemplo, nos espinafres – basta recordar a história do Popeye, que diz ter músculos porque come muitos espinafres. “Estes compostos não são tóxicos para os humanos e têm, inclusivamente, propriedades anabólicas e antidiabéticas interessantes”, explicou, também à AFP, René Lafont, professor do Instituto de Biologia Paris-Seine, da Universidade de Sorbonne. “Estas moléculas estão, efetivamente, presentes em pequenas quantidades nos insetos, mas estão em quantidades muito maiores em plantas, e em algumas que consumimos (espinafres e quinoa) e que têm quantidades muito maiores de ecdysterona”. Dizer que os insetos “não são adaptados ao consumo humano”, como sugere a publicação, é “categoricamente falso”, defende René Lafont. Por cá, a discussão sobre o consumo de alimentos que contêm insetos ganhou intensidade no ano passado, quando a Direção-Geral da Alimentação e Veterinária (DGAV) deu luz verde à comercialização de várias espécies de insetos em Portugal. Neste momento, há cinco espécies que podem ser comercializadas e utilizadas na alimentação – grilo doméstico, larva de besouro, abelha europeia, gafanhoto e larva da farinha. Estes insetos podem ser vendidos e consumidos inteiros, ou moídos, em forma de farinha, por exemplo. No entanto, alerta a direção responsável pela atribuição destas autorizações, é necessário que o consumidor seja sempre informado da presença de insetos na sua alimentação, uma vez que “diversas espécies de insetos podem causar alergias ou alergias cruzadas, especialmente para quem sofre de alergia a marisco”. Depois desta explicação, importa também olhar para o autor de tais citações. Segundo a publicação, trata-se do “Dr Rob Schneider”. Este homem partilhou, de facto, esta informação no seu Twitter, no dia 1 de agosto deste ano, mas não é médico, nem profissional ligado à área da saúde, como sugere a publicação. Rob Schneider é um ator e comediante norte-americano, que tem um programa no canal NBC e é também conhecido por partilhar desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Conclusão A maioria das declarações feitas nesta publicação são falsas. Primeiro, a quitina que é encontrada nos insetos está também na fruta e nos legumes. Depois, o facto de a quitina não ser processada no estômago não torna os insetos inadequados ao consumo humano, uma vez que pode ser processada no intestino, tal como acontece com a celulose presente no aipo. Por último, a ecdysterona é um esteróide natural, que está presente, por exemplo, nos espinafres. Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é: ERRADO No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é: FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos. NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
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