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| - O texto começa de forma direta: “Lembrem-se de uma coisa simples e não ouçam ninguém: é sempre possível curar as articulações, mesmo na idade muito avançada”. Uma publicação que está a ser partilhada nas redes sociais apresenta a solução para o tratamento das articulações – seja osteocondrose, seja artrite avançada – em pouco mais de três meses. Quem o afirma é Maria Gouveia, que é apresentada como sendo “médica portuguesa, cardiologista, terapeuta, professora” e que junta ainda ao seu currículo o cargo de “reitora da Universidade Nacional de Medicina” e “editora dos periódicos ‘Coração e Vasos’, ‘Dores nas articulações’ e ‘Therapia’”.
Ao longo do texto, escrito em formato de pergunta/resposta, Maria Gouveia afirma que o segredo consiste em “recuperar o suprimento sanguíneo” de forma a devolver “a saúde às articulações” e, pode ainda ler-se, ela própria “livrava pessoas de cadeiras de rodas”. Eventualmente chega a referência a um produto que é responsável pelo sucesso de “mais de 94% de todos os pacientes testados”.
Mas será que esta entrevista é real? Não só não é real como a apresentação da médica Maria Gouveia é uma construção que mistura realidade e ficção e vale a pena analisar por partes.
A fotografia é talvez a primeira questão a levantar dúvidas. Segundo uma pesquisa na plataforma de identificação de imagens TinEye, o Polígrafo identificou que a mulher representada na imagem é Kateryna Amosova, reitora da Universidade Nacional de Medicina O.O. Bolomelets, em Kiev, na Ucrânia. Apesar de a fotografia estar falsamente associada ao nome de uma médica portuguesa, Kateryna Amosova não tem qualquer relação com Portugal, tendo cidadania ucraniana e russa. No entanto, há uma relação entre a fotografia escolhida e o cargo de reitora da Universidade Nacional de Medicina.
Mas em Portugal não existe uma Universidade Nacional de Medicina e os cursos de Medicina são apenas lecionados, segundo dados da Direção-Geral do Ensino Superior relativamente aos concursos de acesso ao Ensino Superior para o ano letivo de 2019/2020, em seis universidades – Beira Interior, Coimbra, Lisboa, Nova de Lisboa, Minho e Porto (onde é possível frequentar o curso na Faculdade de Medicina ou no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar).
À semelhança do que se passa com a Universidade, também a referência à Academia Nacional de Ciências Médicas é errada. O que seria correto, se estivéssemos a falar de uma academia portuguesa, seria Academia Nacional de Medicina de Portugal. Ao pesquisar entre os membros que integram esta academia não se encontra o nome de Maria Gouveia.
Na apresentação da suposta médica também se refere que é “editora-chefe dos periódicos ‘Coração e Vasos’, ‘Dores e articulações’ e ‘Therapia’”. A primeira publicação indicada é real: A “Coração e Vasos” foi lançada em 2017 e é um projeto desenvolvido pelo Departamento de Coração e Vasos do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHLN), onde se inclui o Hospital de Santa Maria e o Hospital Pulido Valente. O projeto é dirigido por José Alberto Soares e, segundo a ficha técnica da revista, não tem nem o cargo de editora-chefe nem a referência a Maria Gouveia. Por ser um projeto do CHLN, o Polígrafo procurou o nome de Maria Gouveia entre a lista de profissionais de saúde na área da Cardiologia de ambos os hospitais e, novamente, não encontrou qualquer referência à médica. Já as outras publicações referidas – “Dores e Articulações” e “Therapia” – não existem.
A entrevista é portanto falsa e não tem qualquer fundamento médico. Foi criada com o propósito de credibilizar e promover um produto e é também por isso que existem várias ligações no decorrer do texto para uma página de vendas do referido creme. A utilização de um nome português e a referência a elementos reais – como é o caso da publicação “Coração e Vasos” – tem como objetivo despistar possíveis dúvidas dos leitores. Mas trata-se de uma fraude.
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam naquela rede social.
Na escala de avaliação do Facebook este conteúdo é:
Falso: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Na escala de avaliação do Polígrafo este conteúdo é:
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